quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Poesia De Quinta Na Usina: D'Araújo: O Viajante


Se hoje sou quem sou, é porque me fizeste assim.
Sigo o meu caminho sem observar o caos, ao meu redor, 
simplesmente sigo em frente.

Não mim importa aonde vou chegar, 
pois o semblante de tristeza na face 
de cada ser, já é uma realidade incontestável.

Sigo a velha trilha deixada ao longo dos 
tempos pelos velhos sonhadores como eu.

A observar apenas quantos ainda andam 
as cegas neste horizonte de perdição.



Por favor, alguém me avisa quando, 

me chegar o tempo findo, pois estou 
seguindo o meu coração sem me 
preocupar com o doce tempo.

D'Araujo


D'Araújo: Beco dos Poetas:26-04-2015


Poesia de Quinta Na Usina: Machado de Assis: VAI-TE:



1º jan. 1858

Por que voltaste? Esquecidos
Meus sonhos, e meus amores
Frios, pálidos morreram
Em meu peito. Aquelas flores
Da grinalda da ventura
Tão de lágrimas regada,
Nesta fronte apaixonada
Cingida por tua mão,
Secaram, mortas estão.
Pobre pálida grinalda!
Faltou-lhe um orvalho eterno
De teu belo coração.
Foi de curta duração
Teu amor: não compreendeste
Quanto amor esta alma tinha...
Vai, leviana andorinha,
A outro clima, outro céu:
Meu coração? Já morreu
Para ti e teus amores,
E não pode amar-te — vai!
O hino das minhas dores
Dir-to-á a brisa, à noite,
Num terno, saudoso — ai —
Vai-te — e possa a asa do vento
Que pelas selvas murmura,
Da grinalda da ventura
Que em mim outrora cingiste,
Inda um perfume levar-te,
Morta assim: como um remorso
Do teu olvido... eu amar-te?
Não, não posso; esquece, parte;

Eu não posso amar-te... vai!

Poesia de Quinta Na Usina: Machado de Assis: Versos a Corina: III:


Quando voarem minhas esperanças
Como um bando de pombas fugitivas;
E destas ilusões doces e vivas
Só me restarem pálidas lembranças;
E abandonar-me a minha mãe Quimera,
Que me aleitou aos seios abundantes;
E vierem as nuvens flamejantes
Encher o céu da minha primavera;
E raiar para mim um triste dia,
Em que, por completar minha tristeza,
Nem possa ver-te, musa da beleza,
Nem possa ouvir-te, musa da harmonia;
Quando assim seja, por teus olhos juro,
Voto minh'alma à escura soledade,
Sem procurar melhor felicidade,
E sem ambicionar prazer mais puro,
Como o viajor que, da falaz miragem
Volta desenganado ao lar tranqüilo
E procura, naquele último asilo,
Nem evocar memórias da viagem,
Envolvido em mim mesmo, olhos cerrados
A tudo mais, — a minha fantasia
As asas colherá com que algum dia
Quis alcançar os cimos elevados.
És tu a maior glória de minha alma,
Se o meu amor profundo não te alcança,
De que me servirá outra esperança?

Que glória tirarei de alheia palma? *

Poesia De Quinta Na Usina: Fernando Pessoa; Poema: Ao Longe:



Ao longe os montes têm neve ao sol,
Mas é suave já o frio calmo
Que alisa e agudece
Os dardos do sol alto.
Hoje, Nem era, não nos escondamos,
Nada que for necessário porque nós não somos nada.
Não esperamos nada
E ternos frio ao sol.
Mas tal como é, gozemos o momento,
Solenes na alegria levemente,
E aguardando a morte
Como quem a conhece.

Poesia de Quinta Na Usina: Fernando Pessoa; Poema: Aqui:


Aqui, Nem era, longe
De homens e de cidades,
Por ninguém nos tolher
O passo, nem vedarem
A nossa vista as casas,
Podemos crer-nos livres.
Bem sei, é flava, que inda
Nos tolhe a vida o CORPO,
E não temos a mão
Onde temos a alma;
Bem sei que mesmo aqui
Passamos essa carne
Que os deuses concederam
Ao sido Averno antes.
Mas aqui não nos prendem
Mais coisas do que a vida,
Mãos alheias não tomam
Do nosso braço, ou passos
Humanos se atravessam
Pelo nosso caminho.
Não nos sentimos presos
Senão com pensarmos nisso,
Por isso não pensemos
E deixemo-nos crer
Na inteira liberdade
Que é a ilusão que agora
Nos torna iguais dos deuses.