Consciência
Não existe feio
Nem tão pouco o belo
Não há certo ou errado
Não existe sano ou insano.....
Razão
Em um ambiente coloquial
Sepulta-se o pensamento lógico
E a plenitude inversa da razão,
Com as inverdades dos sentimentos frios
E exatos como o passo em falso.......
poema na integra no Livro:
"O Grito da Alma"
Sonhos Mortos
De um enredo sem notas
Visto minhas botas
Que desbotam feito tempo perdido
Vejo o rígido do seco e morno vento
Que desce feito cetim a resvalar em mim
E o assombro do peso
Que cai sobre meus ombros do desconforto....
poema na integra no Livro:
O "Grito da Alma"
À LUCÍLIA
Se eu pudesse ao luar, Lucília bela,
Queimar-te a fronte de insensatos
beijos,
Dobrar-te ao colo, minha flor
singela,
Ao fogo insano de eternais
desejos;
Ai! se eu pudesse de minh’alma
aos elos
Prender tu’alma enfebrecida e
cálida,
Erguer na vida os festivais
castelos
Que tantas noites planejaste,
pálida;
Ai! se eu pudesse nos teus olhos
turvos
Beber a vida da volúpia ao véu,
Bem como os juncos sobre as ondas
curvos
A chuva bebem que derrama o céu,
Talvez que as mágoas que meu
peito ralam
Em cinzas frias se perdessem
logo,
Como as violas que ao verão
trescalam
Somem-se aos raios de celeste
fogo!
Oh! vem Lucília! é tão formosa a
aurora
Quando uma fada lhe batiza o
alvor,
E a madressilva, que ao frescor
vapora
Os ares peja de lascivo amor...
Sou moço ainda; de meu seio aos
ermos
Posso-te louco arrebatar
comigo...
De um mundo novo na solidão sem
termos
Deitar-te à sombra de amoroso
abrigo!
Tenho um dilúvio de ilusões na
fronte,
Um mundo inteiro de esperanças
n’alma,
Ergue-te acima de azulado monte,
Terás dos gênios do infinito a
palma!...
AS SELVAS
Selvas do Novo Mundo, amplos zimbórios,
Mares de sombra e ondas de verdura,
Povo de Atlantes soberano e mudo
Em cujos mantos o tufão murmura.
Salve! minh’alma vos procura embalde,
Embalde triste vos estendo os braços...
Cercam-me o corpo rebatidos muros,
Prendem-me as plantas enredados laços!...
Pátria da liberdade! antros profundos!
Vastos palácios! eternais castelos!
Mandai-me os gênios das sombrias grutas
De meus grilhões espedaçar os elos!...
Ah! que eu não possa me esquivar dos homens,
Matar a febre que meu ser consome,
E entre alegrias me arrojar cantando
Nas secas folhas do sertão sem nome!
Ah! que eu não possa desprender aos ermos
O fogo ardente que meu crânio encerra,
Gastar os dias entre o espaço e Deus
Nas matas virgens da colúmbia terra!
Eu não detesto nem maldigo a vida,
Nem do despeito me remorde a chaga,
Mas ah! sou pobre, pequenino e débil
E sobre a estrada o viajor me esmaga!
Que faço triste no rumor das praças?
Que busco pasmo nos salões dourados?
Verme do lodo me desprezam todos,
O pobre e os grandes de esplendor cercados!
Fere-me os olhos o clarão do mundo,
Rasgam-me o seio prematuras dores,
E à mágoa insana que me enluta as noites,
Declino à campa na estação das flores.
E há tanto encanto nas florestas virgens,
Tanta beleza do sertão na sombra,
Tanta harmonia no correr do rio,
Tanta delícia na campestre alfombra...
Que inda pudera reviver de novo,
E entre venturas flutuar minh’alma,
Fanada planta que mendiga apenas
A noite, o orvalho, a viração e a calma!
AURORA
Antes de erguer-se de seu leito
de ouro,
O rei dos astros o Oriente inunda
De
sublime clarão;
Antes de as asas desprender no
espaço,
A tempestade agita-se e fustiga
O turbilhão
dos euros.
As torrentes de idéias que se
cruzam,
O pensamento eterno que se move
No
levante da vida,
São auras santas, arrebóis
esplêndidos,
Que precedem à vinda triunfante
De um sol
imorredouro.
O murmurar profundo,
enrouquecido,
Que do seio dos povos se levanta,
Anuncia a
tormenta;
Essa tormenta salutar e grande
Que o manto roçará, prenhe de
fogo,
Na face
das nações.
Preparai-vos, ó turbas!
Preparai-vos,
Rebatei vossos ferros e cadeias,
Algozes e
tiranos!
A hora se aproxima pouco a pouco,
E o dedo do Senhor já volve a
folha
Do livro
do destino!
Grande há de ser o drama, a ação
gigante,
Majestosa a lição! luzes e trevas
Lutarão
sobre os orbes!
O abismo soltará seus tredos
roncos,
E o frêmito dos mares agitados
Se unirá aos das turbas.
Os reis convulsarão nos tronos
frágeis,
Buscando embalde sustentar nas
frontes
As úmidas
coroas...
Debalde!... o vendaval na fúria
insana
Os levará com elas, envolvidos
Num
turbilhão de pó!
Vis, abatidos, o fidalgo e o rico
Sairão de seus paços vacilantes
Nos
podres alicerces...
E errantes sobre a terra irão
chorando,
Mendigar um farrapo ao vagabundo,
E um
pedaço de pão!
Estranho povo surgirá da sombra
Terrível e feroz cobrindo os
campos
De
cruentos horrores!
O palácio e a prisão irão por
terra,
E um segundo dilúvio, então de
sangue,
O mundo
lavará!
O sábio em seu retiro,
estupefato,
Verá tombar a imagem da ciência,
Fria
estátua de argila,
E um pálido clarão dirá que é
perto
O astro divinal que às turbas
míseras
Conduz a
redenção!
Como aos dias primeiros do
universo,
O globo se erguerá banhado em
luzes,
Reflexos
de Deus;
E a raça humana sob um céu mais
puro
Um hino insigne enviará,
prostrada
Aos pés
do Onipotente!
Irmãos todos serão; todos
felizes;
Iguais e belos, sem senhor nem
peias,
Nem
tiranos e ferros!
O amor os unirá num laço
estreito,
E o trânsito da vida uma romagem
Se
tornará celeste!
A hora se aproxima pouco a pouco;
O dedo do Senhor já volve a folha
Do livro
do destino!...
Ergue-se a tela do teatro imenso,
E o mistério infinito se desvenda
Do drama
do Calvário!
— 122 —
Bem pequenino
Deixei meu ninho;
Fui correr mundo
Pelo caminho.
Eis chega a noite,
Brilha o luar;
Do fogo em roda
Vão-se aquentar!
Vamos depressa,
Temos café;
Depois diremos
Quem bate o pé.
Tenho hum bentinho,
Tenho hum rozario;
Lá vem as contas
Do meu fadario.
S. Paulo—1850.
CALABAR.
Oh não vendeu-se, não!— elle era escravo
Do jugo portuguez—quiz a vingança;
Abriu sua alma ás ambiçoens de hum bravo
E em nova escravidão bebeu a esp'rança!
Combateu... pelejou... entre a batalha
Viu essas vidas que no pó se somem;
Enrolou-se da pátria na mortalha,
Ergueu-se—inda era hum homem!
Calabar! Calabar!—foi a mentira
Que a maldição cuspio em tua memória
Amaste a liberdade;—era huma lyra
De loucos sonhos, d'elevada gloria!
Alma adejando h'este Ceo brilhante
—Sonhaste escravo reviver liberto;
Subiste ao largo espaço triumphante*
Voaste—era hum deserto!
— 124 —
A quem trahiste, heroe?—na vil poeira
Que juramento te prendia a fé?!
Escravo por escravo—essa bandeira
Foi de hum soldado—lá ficou de pé!
Viu o sol entre as brumas do futuro
—Elle que por si só nada podia;
Quiz vingar-se também,—no sonho escuro.
Quiz ter também seu dia!
O pulso roixo da fatal cadeia
Brandiu huma arma, pelejou também;
Viram-no erguido na refrega feya,
—Sombrio vulto que o valor sustem!
Respeitai-o—que amou a heroicidade!
Quiz erguer-se também do raso chão!
Foi delírio talvez—a eternidade
Teve no coração!
Oh que o Céo era lindo, e o sol se erguia,
Como hum incêndio nas brasüeas terras;
Da cimejra d*% $glva a voz surgia,
E o som dos ventos nas remotas serras!
Adormeceu.,,^ noite em funda calma
Ouvio ao longe os echos da*floresta;
Batteu-Jhe o coração-^triste sua alma
Sorriu-se—era huma festa!