sábado, 16 de outubro de 2021

Dante Alighieri: A Divina Comédia: Inferno:



Eis voz escuto sonorosa e clara: “Honrai todos o altíssimo poeta!
81A sombra sua torna, que ausentara”.
Quatro sombras notei, quando aquieta
O rumor, que a nós vinham: nos semblantes
84 Nem prazer, nem tristeza se interpreta.
E disse o Mestre, após alguns instantes: “Aquele vê, que, qual monarca ufano,
87 Empunha espada e os três deixa distantes.
É Homero, o poeta soberano;
O satírico Horácio é o outro, e ao lado
90 Ovídio, em lugar último Lucano.
Como lhes cabe o nome assinalado Que soou nessa voz há pouco ouvida,
93 Me honrando, honrosa ação têm praticado”.
A bela escola assim vi reunida
Do Mestre egrégio do sublime canto,
96 Águia em seu vôo além dos mais erguida.
Discursado entre si tendo algum tanto, A mim volveram gracioso o gesto:
99 Sorriu Virgílio, dessa mostra ao encanto.
Mais foi-me alto conceito manifesto,
Quando acolher-me ao grêmio seu quiseram,
102 Entre eles me cabendo o lugar sexto. Té o clarão comigo se moveram,
Prática havendo, que omitir é belo,
105 Sublime no lugar, onde a teceram.

Domingo na Usina: Biografias: Eugénio de Paula Tavares:


Eugénio de Paula Tavares (Vila Nova Sintra, Ilha Brava, 18 de outubro de 1867 — Vila Nova Sintra, 1 de junho de 1930), foi um jornalista, escritor e poeta cabo-verdiano.
Não tinha títulos escolares de habilitação. Como José Lopes, outro poeta Cabo-Verdiano, era um auto-didata. A ambos tocou igualmente a centelha do génio. Tavares, possuidor de um carácter impoluto, era também um orador fluente de raros recursos.
A estadia no Mindelo marcou grandemente o jovem bravense. Colocado na Fazenda Pública do Tarrafal, descobre a Santiago profunda e seu vernáculo. De regresso à Ilha Brava em 1890, estava um conhecedor da realidade de Cabo Verde.
Feito Recebedor da Fazenda na Brava, desposou D. Guiomar Leça, senhora de muitas virtudes e companheira fiel para toda a vida. A partir de então devota-se ao seu sonho, assim descrito por João José Nunes:
"(...) em plena pujança da vida, estuante de entusiasmo, Eugénio vive um sonho febril que inflama a sua alma môça e absorve todas as faculdades do seu ser moral - A Felicidade e o Engrandecimento do Povo Caboverdiano, cuja desgraça atroz ele atribui ao desumano abandono a que fora votado."
O Governador Serpa Pinto chega à Colónia e acalenta o sonho do Poeta. Acarinha-o e estimula-o depois de o conhecer. Eugénio corresponde e a sua pena de jornalista exige justiça e moralidade para Cabo Verde.
Nesta fase, a sua "morna" ganha conteúdo e sonoridade. Os novos temas são o Amor, a Ilha, o Mar, a Mulher, o Emigrante, a Partida, a Saudade.
Entre 1890 e 1900, Eugénio Tavares é o "delfim" de Cabo Verde.
Um poema seu, Mal de amor, encontra-se no CD Poesia de Cabo Verde e sete poemas de Sebastião da Gama, de Afonso Dias.
Em 1929 colaborou em diversos artigos na "Revista de Espiritismo", órgão da Federação Espírita Portuguesa. De sua pena saíram vigorosos e destemidos artigos de propaganda neo-espiritualista, prestando, assim os mais relevantes serviços ao Movimento Espírita português.
Obras

Canção ao Mar

Morna aguada

Morna de Despedida.

fonte de origem:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Eug%C3%A9nio_Tavares



Domingo na Usina: Biografias: Corsino António Fortes:



Corsino António Fortes (Mindelo, 14 de Fevereiro de 1933 - Mindelo, 24 de Julho de 2015) foi um escritor e político cabo-verdiano.[1]
Nascido a 14 de fevereiro de 1933 na zona mais pobre do Mindelo, na ilha de São Vicente, Corsino António Fortes ficou órfão quando ainda andava na escola. Teve de trabalhar, como ferreiro e depois em escritórios por 4$ ao dia.[carece de fontes]
A poesia tornou-se pública na sua vida, em 1957, quando saíram os seus primeiros poemas no jornal do 3º Ciclo Liceal. cadrastrou-se em Direito, pela Universidade de Lisboa em 1966, onde viveu na Casa dos Estudantes do Império. Já em Angola, como juiz do Tribunal de Benguela e Luanda, não permitiu que os papéis judiciais o afastassem da poesia. E aí, militante do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde) na clandestinidade, usou a escrita para lutar contra o domínio colonialista. Os seus poemas apareceram nos anos 1960 em algumas publicações como a revista Claridade ou a antologia Modernos Poetas Caboverdianos. Mas só lançou o seu primeiro livro em 1974, Pão & Fonemas, que com Árvore & Tambor Editores em 1986 e Pedras de Sol & Substância (2001) formou A Cabeça Calva de Deus. A trilogia conta a saga do povo para a liberdade.[2]
Integrou vários governos na república de Cabo Verde,[3] tendo sido o primeiro embaixador cabo-verdiano em Portugal, em 1975.[4]
Presidiu à Associação dos Escritores de Cabo Verde (2003-2006). As obras como Pão e Fonema ou Árvore e Tambor expressam uma nova consciência da realidade cabo-verdiana e uma nova leitura da tradição cultural daquele arquipélago.[5]
Principais trabalhos

Pão & Fonema (1974)

Árvore & Tombor (1986)

Pedras de Sol & Substância (2001)

Os poemas De boca a barlavento e De boca concêntrica na roda do sol encontram-se no CD Poesia de Cabo Verde e sete poemas de Sebastião da Gama, de Afonso Dias.

A cabeça calva de Deus (2001) (trilogia — Pão & Fonema, Árvore & Tombor e Pedras de Sol & Substância)

Bibliografia

(em francês) Manuel Veiga (dir.), Insularité et littérature aux îles du Cap-Vert (trad. du portugais par Elisa Silva Andrade), Karthala, Paris, 1997, 266 p. ISBN 2-86537-797-0

fonte de origem:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Corsino_Fortes

Domingo na Usina: Biografias: Carlos Filipe Fernandes da Silva Gonçalves:



Carlos Filipe Fernandes da Silva Gonçalves (Mindelo, 12 de Outubro de 1950), jornalista e investigador de Cabo Verde, ex-director da Rádio Comercial, autor do livro intitulado Kap Verd Band. Na obra, com 250 páginas, Carlos Gonçalves reúne entrevistas, conversas e pesquisas de fundo sobre documentação escrita de vários autores, desde o princípio até o fim do século XX, sobre a música de Cabo Verde.
Biografia
Carlos Filipe Fernandes da Silva Gonçalves nasceu a 12 de Outubro de 1950 no Mindelo (Cabo Verde). Filho de Arnaldo da Silva Gonçalves e de Ivone Aida Lopes Fernandes Ramos. Carlos Gonçalves pertence a uma família de grandes figuras literárias, incluindo seu tio António Aurélio Gonçalves, sua tia Orlanda Amarílis Lopes Rodrigues Fernandes Ferreira, seu avô materno Armando Napoleão Rodrigues Fernandes, que publicou o primeiro dicionário de língua crioula-portuguesa em Cabo Verde e Baltazar Lopes da Silva.
Obra
Autor do livro intitulado Kap Verd Band. Na obra, com 250 páginas, Carlos Gonçalves reúne entrevistas, conversas e pesquisas de fundo sobre documentação escrita de vários autores, desde o princípio até o fim do século XX, sobre a música de Cabo Verde.
O autor inclui uma análise sobre todos os géneros musicais cabo-verdianos, nomeadamente colá, festa da bandeira, batuque, tabanca, cantigas de trabalho, entre outros. Ele faz ainda uma descrição dos instrumentos musicais que fazem parte da história da música cabo-verdiana, os conjuntos, as vozes, a discografia, o nascimento das editoras e as rainhas da nossa música.
Trata-se de uma edição de luxo, com alta qualidade gráfica. A edição é do Instituto do Arquivo Historico Nacional e será distribuido e comercializado pelo Instituto da Biblioteca Nacional.
O livro com mais de 250 páginas, amplamente ilustrado com várias dezenas de fotos, algumas históricas e raras.fonte de origem:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Carlos_Filipe_Gon%C3%A7alves

Domingo na Usina: Biografias: Baltasar Lopes da Silva:


 
Baltasar Lopes da Silva (Caleijão, São Nicolau, 23 de abril de 1907 — Lisboa, 28 de maio de 1989[1]) foi um escritor, poeta e linguista de Cabo Verde que escreveu em português e em crioulo.[2]
Com Jorge Barbosa foi um dos fundadores da revista Claridade. Em alguns dos seus poemas usou o pseudónimo Osvaldo Alcântara. Encontra-se colaboração da sua autoria na revista luso-brasileira Atlântico.[3]
O seu romance mais conhecido é Chiquinho (1947).[4] Escreveu também uma descrição dos crioulos de Cabo Verde, O Dialecto Crioulo de Cabo Verde, Lisboa, Imprensa Nacional, 1957.
Um poema seu, Ressaca, encontra-se no CD Poesia de Cabo Verde e Sete Poemas de Sebastião da Gama, de Afonso Dias.[5]
Baltasar Lopes da Silva nasceu na aldeia do Caleijão na ilha de São Nicolau em Cabo Verde no dia 23 de abril de 1907. Tendo concluído os seus estudos secundários no seminário de São Nicolau, viajou para Portugal para estudar na Universidade de Lisboa. Durante o seu tempo em Lisboa, Baltasar Lopes estudou com importantes nomes da cultura portuguesa, como, por exemplo, Vitorino Nemésio e Luís da Câmara Reis. Formou-se em Direito e Filologia Românica, tendo sempre obtido excelentes notas durante os seus estudos na Universidade de Lisboa. Depois da universidade, Baltasar Lopes regressou a Cabo Verde, onde exerceu o cargo de professor no Liceu Gil Eanes em São Vicente. Após alguns anos foi nomeado reitor deste liceu.
A 5 de junho de 1962, foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique; a 12 de julho de 1972, foi agraciado com o grau de Comendador da Ordem da Instrução Pública; a 20 de junho de 1987, foi agraciado com a Medalha de Cavaleiro da Ordem do Infante D. Henrique, todos de Portugal.[6][7]
Chegou a deixar a colónia portuguesa mais escolarizada para ensinar em Leiria (Portugal) por um breve período, mas devido às dificuldades de relacionamento com a política portuguesa daquela época, regressou para Cabo Verde onde continuou educando e exercendo a advocacia. Os seus últimos dias foram passados em Lisboa, para onde foi transferido para ser submetido a tratamento de uma doença cérebro-vascular, falecendo pouco depois, no dia 28 de maio de 1989.
Obra
Em 1936, Baltasar Lopes, com a colaboração de outros escritores, como Manuel Lopes, Manuel Ferreira, António Aurélio Gonçalves, Francisco José Tenreiro, Jorge Barbosa e Daniel Filipe, fundaram a revista cabo-verdiana Claridade. Era uma revista de ensaios, poemas e contos. Os colaboradores da revista denunciavam os problemas da sua sociedade, como a Seca, a fome e a emigração.
Criaram assim melhores condições para o conhecimento das raízes da cultura cabo-verdiana. A revista Claridade salientou o estudo da realidade cabo-verdiana, especialmente dos grupos sociais mais carenciados.

fonte de origem:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Baltasar_Lopes_da_Silva

Domingo na Usina: Biografias: Artur Augusto da Silva:


Artur Augusto da Silva (Ilha Brava, 14 de Outubro de 1912 - Bissau, 11 de Julho de 1983) foi um advogado, jornalista e escritor Cabo-verdiano.
Artur Augusto Silva nasceu na Ilha da Brava, em Cabo Verde a 14 de Outubro de 1912 e faleceu em Bissau a 11 de Julho de 1983. Viveu com os pais na Guiné (Farim) até aos 8 anos de idade e só regressou à Guiné quase 30 anos depois.
Foi aluno do Liceu Camões e em 1932 entrou no primeiro ano de Direito em Lisboa. Foi colega nomeadamente de Álvaro Cunhal que deve ter tido uma influencia muito positiva no posicionamento politico de Artur Augusto. Ainda estudante, foi Director da revista “Momento”, réplica lisboeta da coimbrã “Presença”, onde se propunha com outros literatos jovens abrir uma “Tribuna Livre” em que livremente se discutisse e todos pudessem falar. Foi amigo de Fernando Pessoa que lhe dedicou o livro “Mensagem”. Com o amigo Thomaz de Mello lança em 1936, a revista de Arte “Cartaz”. Contribuiu com poemas para a revista Cabo Verdiana “Claridade”.
Publicou vários artigos, fez reportagens, dirigiu saraus literários, organizou exposições de arte moderna, promoveu conferências culturais na Casa da Imprensa, na Sociedade Nacional de Belas Artes, no Grémio Alentejano e em vários outros locais de Portugal.
Licenciou-se em Direito em 1938. Em 1939, partiu para Angola, onde trabalhou como Secretário do Governador Geral. De 1941 a 1949 exerceu advocacia em Lisboa, em Alcobaça e em Porto de Mós.
Em Outubro de 1945 participa com um grupo de opositores ao Estado Novo na criação do Movimento de Unidade Democrática que Salazar ilegaliza em 1947.
Já na Guiné, foi um dos intelectuais que trabalhou entre 1948 e 1948 para erguer o Colégio Liceu de Bissau (atual Liceu Nacional Kwame N'Krumah), que iniciou suas atividades em 1950, ainda ocupando umas salas do Museu da Guiné. Chegou a ser professor na instituição.[1]
Em 1949, começa a ser citado numa série de documentos da PIDE relativos a indivíduos suspeitos de pertencer ao Partido Comunista e com a repressão violenta nas eleições com Norton de Matos, antes de ser preso, parte para a Guiné onde foi advogado, notário e substituto do Delegado do Procurador da República. Foi também Membro do Centro de Estudos da Guiné, juntamente com Amílcar Cabral, de quem era grande amigo.
Visitou vários países africanos, recolhendo elementos que mais tarde lhe serviriam para escrever, entre outros livros, “Os Usos e Costumes Jurídicos dos Fulas”.

fonte de origem:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Artur_Augusto_da_Silva



Domingo na Usina: Biografias: Arménio Adroaldo Vieira e Silva:




Arménio Adroaldo Vieira e Silva (Praia, Santiago, 24 de janeiro de 1941) é um jornalista e escritor da língua portuguesa cabo-verdiano.
Elemento activo da geração de 1960, colaborou em SELÓ - folha dos novíssimos, Boletim de Cabo Verde, revista Vértice (Coimbra), Raízes, Ponto & Vírgula, Fragmentos, Sopinha de Alfabeto, entre outras publicações. Foi redactor do extinto jornal Voz di Povo.
Em 1981 lançou o livro Poemas.
Foi o primeiro Cabo-verdiano, em 2009, a vencer o Prémio Camões.
Em Junho de 2013 publicou O Brumário e Derivações do Brumário. Início de uma série com "versos livres, notas poéticas e miscelâneas".
Publicações

1981 - Poemas - África Editora - Colecção Cântico Geral. - Lisboa - poemas.

1990 - O Eleito do Sol - Edição Sonacor EP - Grafedito - Praia - novela.

1998 - Poemas (reedição) - Ilhéu Editora - Mindelo - poemas.

1999 - No Inferno - Centro Cultural Português - Praia e Mindelo - romance.

2006 - MITOgrafias - Ilhéu Editora - Mindelo - poemas.

2009 - O Poema, a Viagem, o Sonho - Editorial Caminho - Lisboa - poemas.

2013 - O Brumário

2013 - Derivações do Brumário

2014 - Fantasmas e Fantasias do Brumário

Curiosidades

Três poemas seus (Lisboa - 1971, Quiproquo e Ser tigre), encontram-se no CD Poesia de Cabo Verde e sete poemas de Sebastião da Gama, de Afonso Dias.

fonte de origem:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Arm%C3%A9nio_Vieira

Domingo na Usina: Biografias: António Aurélio Gonçalves:



António Aurélio Gonçalves, conhecido como Nhô Roque (Mindelo, São Vicente, 25 de setembro de 1901 - idem, 30 de setembro de 1984) foi um escritor, crítico, historiador e professor cabo-verdiano. Nasceu na cidade de Mindelo (Cabo Verde), São Vicente, em 25 de setembro de 1901 e faleceu no dia 30 de setembro de 1984, vítima de atropelamento.[1][2]
Biografia
Era filho de Roque da Silva Gonçalves.
Esteve ausente de S. Vicente durante vinte e dois anos: foi para Lisboa em 1917 para continuar os estudos liceais depois do seminário na Ilha de São Nicolau e fazer um curso superior. Matriculou-se em medicina, que frequentou durante dois anos. Seguidamente estudou Belas Artes e, finalmente, História e Filosofia. Voltou à sua terra natal só nos inícios de 1939.
Ativo e crítico nas mais diversas áreas – prefácios de livros, seminários de literatura no Curso de Formação de Professores do Ensino Secundário, artigos em revistas como Ponto & Vírgula.
Foi professor de História e Filosofia no liceu do Mindelo nos liceus Gil Eanes e na escola técnica.
Em Setembro de 1984 faleceu atropelado por uma viatura que o apanhou a atravessar a rua[3].
Obras

Aspecto da Ironia de Eça De Queiroz, ensaio, 1937

Terra da Promissão; reimpressão: 2002, Lisboa, Editorial Caminho; com prefácio de Arnaldo França[4]

Recaída; 1947; reimpressão: 1993; Editora Vega

Noite de Vento, 1951: 2.ª edição: Praia, 1985; com prefácio de Arnaldo França

Virgens loucas, 1971.

fonte de origem:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Aur%C3%A9lio_Gon%C3%A7alves

Domingo na Usina: Biografias: Amílcar Lopes Cabral:


Amílcar Lopes Cabral (Bafatá, Guiné Portuguesa, actual Guiné-Bissau, 12 de setembro de 1924 — Conacri, 20 de janeiro de 1973) foi um político, agrônomo e teórico marxista[1] da Guiné-Bissau e de Cabo Verde.[2]
Filho de Juvenal Lopes Cabral (cabo-verdiano[2] de ascendência guineense), professor, e de Iva Pinhel Évora (guineense de ascendência caboverdiana[2]) nasceu em Bafatá, Guiné-Bissau, onde o seu pai foi colocado à época, como professor.[3]
Aos oito anos de idade, sua família mudou-se para Cabo Verde, estabelecendo-se em Santa Catarina (ilha de Santiago), que passou a ser a cidade de sua infância, onde completou o ensino primário. De seguida mudou com a mãe e os irmãos para Mindelo, São Vicente, onde veio a terminar o curso liceal em 1943, no Liceu Gil Eanes. Como apontado por Patrícia Villen,[4] sua adolescência remete a um período de intensa seca e fome na ilha. Nos anos 40, por exemplo, essa crise provocou a morte de 50 mil pessoas, além da imigração em massa de cabo-verdianos.
No ano seguinte, mudou-se para a cidade de Praia, na Ilha de Santiago, e começou a trabalhar na Imprensa Nacional, mas só por um ano pois, tendo conseguido uma bolsa de estudos, no ano de 1945 ingressou no Instituto Superior de Agronomia,[2] em Lisboa. Único estudante negro de sua turma, Cabral logo se envolve em reuniões de grupos antifascistas e, ao lado de outros alunos vindos da África, tais como Mário de Andrade, Agostinho Neto e Marcelino dos Santos que conheceu na Casa dos Estudantes do Império "conhece vetores culturais da reafricanização dos espíritos do movimento da negritude dirigido por Léopold Sédar Senghor".[4] Após graduar-se em 1950, trabalhou por dois anos na Estação Agronómica de Santarém.
Contratado pelo Ministério do Ultramar como adjunto dos Serviços Agrícolas e Florestais da Guiné, regressou a Bissau em 1952. Iniciou seu trabalho na granja experimental de Pessube percorrendo grande parte do país, de porta em porta, durante o Recenseamento Agrícola de 1953 adquirindo um conhecimento profundo da realidade social vigente. Suas atividades políticas, como a criação da primeira a Associação Esportiva, Recreativa e Cultural da Guiné, aberta tanto aos "assimilados" quanto aos indígenas, reservam-lhe a antipatia do Governador da colônia, Melo e Alvim, que o obriga a emigrar para Angola. Nesse país, une-se ao MPLA.[2]
Em 1955, Cabral participa da Conferência de Bandung e toma conhecimento da questão afro-asiática. Em 1959 juntamente com Aristides Pereira, seu irmão Luís Cabral, Fernando Fortes, Júlio de Almeida e Elisée Turpin, funda o partido clandestino Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). Em 3 de agosto de 1959, o partido teve participação na greve de trabalhadores do porto de Pidjiguiti, fortemente reprimida pelo governo colonial, resultando na morte de 50 manifestantes e no ferimento de outras centenas. Quatro anos mais tarde, o PAIGC sai da clandestinidade ao estabelecer uma delegação na cidade de Conacri, capital da República de Guiné-Cronacri. Em 23 de janeiro de 1963 tem início a luta armada contra a metrópole colonialista, com o ataque ao quartel de Tite, no sul da Guiné-Bissau, a partir de bases na Guiné-Conacri.

fonte de origem:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Am%C3%ADlcar_Cabral



Domingo na Usina: Biografias: Aguinaldo Brito Fonseca:


 
Aguinaldo Brito Fonseca (Mindelo, Cabo Verde, 22 de setembro de 1922 — Lisboa, 24 de janeiro de 2014) foi um poeta cabo-verdiano.[1] A sua poesia é bastante difundida na internet e em obras coletivas editadas diversos países.
Aguinaldo Fonseca instalou-se em Lisboa em 1945, residindo na Casa dos Estudantes do Império. Viu os seus poemas publicados em vários jornais portugueses de então.
Colaborou na revista luso-brasileira Atlântico [2] e no semanário Mundo Literário[3] (1946-1948).
Ficou conhecido como "o poeta esquecido", mesmo depois de ter publicado a coleção "Linha do Horizonte", em 1951, e de, sete anos mais tarde, ter reunido uma seleção dos poemas no suplemento cultural Notícias de Cabo Verde, tal como o retratou Michel Laban, um investigador argelino estudioso da literatura lusófona, que faleceu em Paris em dezembro de 2008.
A sua poesia retratava o ardor cívico e expunha firmemente as injustiças sociais, tal como é referido na Grande Enciclopédia Soviética, datada de 1979, estando traduzida em russo.
Poemas célebres

Mãe negra

Canção dos rapazes da ilha.

fonte de origem:

Dante Alighieri: A Divina Comédia: Inferno:


 
“Para a glória outros muitos mais afasta Do Limbo; e sabe tu que antes não fora
63 Salvo quem pertencera à humana casta”.
Andávamos, enquanto isto memora, Sem parar, pela selva penetrando,
66 Selva de almas, que aumenta de hora em hora,
E da entrada não longe ainda estando, Eis um clarão brilhante divisamos
69 Das trevas o hemisfério alumiando.
Dali distantes ainda nos achamos
Não tanto, que eu não discernisse em parte
72 Que à sede de almas nobres caminhamos.
“Ó tu, que és honra da ciência e da arte, Quem são” — disse — “os que, aos outros preferidos,
75 Privilégio tamanho assim disparte?”
Falou Virgílio: “— Assim são distinguidos Do céu, que atende à fama alta e preclara, 78 Com que foram na terra engrandecidos”.

Contos do Sábado na Usina: Camilo Castelo Branco:

 


 

XVIII

Chegaram por este tempo, vindos das terras de Basto a Requião, os tão almejados missionários, interrompidos no seu estéril apostolado pela revolução de Maria da Fonte. Marta ouviu a notícia com alvoroço, e disse que queria seguir os sermões – que precisava de salvar a sua alma. O Feliciano viera um pouco estragado de Pernambuco a respeito de religião; mas respeitava as crenças alheias, e não contrariava as devoções da sobrinha. O padre Roque era de parecer que se não deixasse Marta entrar muito pela mística; aconselhava o marido que fosse viajar com a mulher, que a tirasse daquela terra, porque as suas enfermidades não podiam curá-las os sermões nem as hóstias. O egresso conhecia a farmácia do varatojano de Borba da Montanha, e sabia que a primeira receita de Frei João era exorcismá-la como demoníaca.
– Dão cabo dela, vocês verão, dão cabo dela – dizia o padre-mestre.
Eram quatro os missionários que assentaram o vestíbulo do paraíso em Requião.
O padre José da Fraga, ainda novo, bem composto e limpo nas suas vestes sacerdotais, grave e semblante inteligente. Tinha-se ordenado em Brancanes com o propósito de ir propagar o cristianismo na China; depois, interesses e rogos de família determinaram-no a ficar na pátria, sem abrir mão da vocação apostólica. Lera e percebera Raulica, Lacordaire, e imitava o segundo com bastante engenho. O padre Osório dizia-lhe que guardasse as suas pérolas para outro auditório menos suíno. E, de feito, as mulheres, quando de madrugada o viam no púlpito, aconchegavam-se umas das outras para comodamente tosquenejarem o seu sono da manhã; e os homens diziam que não o chamava Deus por aquele caminho – que não calhava p'r'á prédega.
O padre Cosme de Tagilde, robusto, de meia-idade, autor da Escala do Céu pelas Escarpas do Gólgota e da Via Seráfica para o Reino dos Querubins, era pregador de sentimento. Tinha sido furriel no exército realista, e ordenara-se para herdar uns bens de uma parenta beata que tinha horror à tropa. Lera as novelas do Prévost e Madama de Genlis, quando era furriel. Ficou-lhe dessas leituras uma linguagem amelaçada, com interjeições trágicas, e um jeito especial de tocar as mães com imagens ternas tiradas das coisas infantis. Por exemplo: E o teu filhinho, mulher, o filhinho que Deus te levou para a companhia dos anhos, quando lá do Céu te vê pecar, estende para ti os seus bracinhos, e diz: Mãe, ó mãe! não peques; mãe, não peques! pelas lágrimas que por mim choraste, não caias na tentação, porque, se te perdes, se te afundas no abismo eterno, não tornarás a ver o teu filhinho que te chama do Céu, mãe, ó mãe! E infantilizava o timbre da voz, inclinava a um lado a cabeça num langor menineiro, estendia os braços do púlpito abaixo com as mãos abertas, alongava os beiços no jeito da boquinha de criança, e muito mavioso, num trémulo de voz e braços: Mãe! ó mãe! E todas as que tinham perdido filhinhos desatavam num berreiro.
O padre Silvestre da Azenha, homem antigo, de uma porcaria de sotaina digna dos hagiológios, boa pessoa, incapaz de mentir voluntariamente, era forte na topografia do Inferno e nas genealogias, usos e costumes dos diversos diabos. Afirmava que a legião deles se dividia cm esquadras, capitaneadas por Lúcifer, príncipe da Luxúria, por Asmodeu, Satanás, Belzebu e outros, cada um com a pasta ministerial dos seus competentes vícios. Dava notícia de um caudilho de esquadra, chamado Beemote, cujo empenho era bestializar os fiéis – verdadeira superfluidade. – Leviatã capitaneava o esquadrão da Soberba; e o ministro e secretário de Estado encarregado da pasta da Avareza chamava-se Mamona. A ciência moderna matou este diabo, extraiu-lhe o óleo, e pô-lo ao serviço dos intestinos dos pecadores – óleo de Mamona. Explicava o padre às mulheres o que era a corja dos demónios íncubos. Contava casos de algumas que ficaram grávidas desses devassos, e dizia em latim que tais demónios fecundos podiam, mesmo contra a vontade da mulher, rem habere cum illa. E as mulheres, sem pôr mais na carta, farejavam o latim e murmuravam indignadas: – T'arrenego! Catixa! cruzes, canhoto! – e benziam-se, cuspinhando nos calcanhares umas das outras.
Frei João de Borba da Montanha, conquanto não frequentasse o púlpito, era o vulto mais proeminente da missão. Saíra já velho do Varatojo, peito fraco, um pigarro crónico de catarro pituitoso, com poucos dentes, por onde as palavras lhe saíam assobiadas que nem melro nos sinceirais de Julho. Por isso o confessionário era a sua faina de prospérrimas colheitas para o Céu, e os exorcismos a sua famosa glória cheia de triunfos sobre todas as esquadras dos demónios conhecidos do seu companheiro padre Azenha. Eram ambos, de mãos dadas, o terror do Inferno; um a explorar diabos no planeta, o outro a enxotá-los. À omnipotência deste varatojano é que o vigário de Caldelas confiara a redução da mãe de José Dias.
Este egresso tinha feito à sua custa a terceira edição do Pecador Convertido ao Caminho da Verdade, obra do seu conventual varatojano Frei Manuel de Deus. Vendia o livro por 720, meia encadernação. Chamava-lhe ele o seu balde de tirar almas do profundo poço do enxofre infernal. Todas as beatas se consideravam mais ou menos empoçadas, e por 720 metiam-se no balde de Frei João. Barato.
Foi este o missionário escolhido por Simeão, de harmonia com o genro. Marta lembrava-se que o seu José Dias lhe falara nele com muita esperança em que desfizesse os obstáculos do casamento. Quis confessar-se ao varatojano. e revelou para esse acto uma expectativa seráfica, grande deliberação ansiosa, um sobressalto jubiloso em que parecia influir a cooperação sobrenatural do querido morto. O padre Osório entrevia prelúdios de loucura nas alegres disposições com que Marta, num recolhimento contemplativo, desde o apontar da aurora, esperava à
porta da igreja que chegassem os missionários com o cortejo das mulheres encapuchadas, muito ramelosas, estralejando os seus tamancos ferrados na grade do adro que vedava a passagem aos porcos.
Enquanto na igreja, depois da missão, se depunha a hóstia nas línguas saburrentas e gretadas das beatas – que engoliam aquela farinha triga como quem devora sevamente um Deus – cá fora armavam-se no adro dois tabuleiros, assentes em tripeças de engonços, com seus pavilhões de guarda-sóis de paninho azul. Algumas mulheres de aspectos repelentes, sujas da poeira das jornadas, com os canelos calosos e encodeados, expunham nos tabuleiros as suas mercadorias, e ao mesmo tempo injuriavam-se reciprocamente por velhas rixas invejosas à conta de subornarem freguesas com caramunhas e palavreados. No silêncio do templo, ouvia-se cá de fora: – Arre, bêbeda! – Cala-te aí, calhamaço!
A exposição bibliográfica, feita nos tabuleiros, além das obras em brochura e encadernadas dos missionários, constava da Regra de S. Bento, da Missão Aumentada, da Missão Abreviada, das Piedosas Meditações, das Horas do Cristão, do Mês de Maria, do Mês de Jesus e do Livro de Santa Bárbara. Havia também Novenas, Via-sacras com estampas de um horror sacrílego, uns Cristos que pareciam manipanços do Bié. Seguia-se a camada dos Escapulários; uns eram de N. S. do Carmo, de N. S. das Dores, da Conceição; outros do Preciosíssimo sangue de Jesus, do Coração do mesmo, da Santíssima Trindade e de S. Francisco. Tinham grande saída os Cordões do mesmo santo, e as Correias de S. Agostinho, com um botão de osso, a apertar na cintura – arnês impenetrável ao Diabo, por causa do botão, que, posto na correia, tem virtudes para osso muito admiráveis, quase como as da carne, mas no sentido inverso – ela atraindo o cão tinhoso, e ele repulsando-o. De Santo Agostinho e do Anjo da Guarda também havia Rezas enfiadas em metal, ou em cordão, simplesmente, mais baratinhas. Na espécie medalheiro, grande profusão: as medalhas mais procuradas eram as do Coração de Maria do Coração de Jesus, do Anjo da Guarda e de Santa Teresa, a 10 réis.
As coroas, penduradas em barbantes ou estendidas em meadas, eram diversas no tamanho e na nomenclatura: as seráficas com sete mistérios, e cada mistério com dez ave-marias; as da Srª da Conceição com doze Aves e três mistérios: – uma certa conta que os missionários lá graduavam com a gafaria espiritual das confessadas. Havia algumas que se aguentavam com os Rosários de quinze mistérios, e a Coroa dos nove coros dos Anjos, e a do Preciosíssimo sangue e coração de Jesus. Mas o grande consumo era de contas de azeviche, refractárias aos maus-olhados; de modo e maneira que, se o azeviche é legítimo, senhores, logo que um inimigo nos encara a conta racha de meio a meio.
Marta, a beata, a senhora brasileira de Prazins, como lhe chamavam as regateiras das drogas da salvação, fornecera-se de tudo em duplicado; mas sobre todos os devocionários o da sua leitura dilecta era o Pecador Convertido ao Caminho da Verdade, edição do seu confessor varatojano, Frei João de Borba da Montanha.
São impenetráveis os segredos revelados no tribunal da penitência por Marta ao seu director espiritual. O padre Osório, não obstante, suspeitava que a penitente revelasse, com escrupulosa consciência, solicitada por miúdas averiguações do missionário, saudades, reminiscências sensualistas, carnalidades que se lhe formalizavam no espírito dementado, enfim, visões e sonhos com o José Dias. Inferia o padre a sua conjectura, sabendo que Frei João lhe mandara ler no Pecador Convertido, três vezes por dia, o capítulo 33, intitulado Resistência às tentações contra a castidade. Fortalecia esta hipótese ter dito Marta a D. Teresa que a alma de José Dias lhe aparecia em sonhos; e às vezes, mesmo acordada, lhe parecia senti-lo na cama à sua beira; e então mordia o travesseiro para que o tio a não ouvisse chorar. Pode ser que estas revelações, comunicadas ao confessor, um simplório incapaz de destrinçar entre doença e pecado, fossem acompanhadas de particularidades sensitivas que Marta por vergonha não contava à sua amiga. É certo que a confessada do varatojano lia, declamando, diante do seu oratório, três vezes, por dia, a Resistência às tentações contra a castidade.
A oração dizia assim:
Senhor amorosíssimo, não vos escondais, não me deixeis sozinha, que me cerca o leão para me devorar; os seus rugidos me atormentam para que não goste das suavidades do vosso amor. Cercarei todo o Mundo, subirei aos Céus, não descansarei enquanto não achar o meu amor. Conjuro-vos, filhas de Jerusalém, criaturas da terra que, se encontrares o meu amado, lhe digais que morro de amor. E, se quereis os sinais para conhecê-lo, ouvi. O meu amado é cândido e rubicundo, escolhido entre milhares; cândido por divino, e rubicundo por humano, cândido porque inocente, e rubicundo por chagado. Ai! doce amor, onde vos escondestes? Tende compaixão de quem vos busca. Estes sinais que de vós tenho só servem de avivar-me a saudade, são setas que me ferem; morro, desfaleço, se vos não acho.
Os cabelos da sua cabeça são como p ouro mais puro e mais precioso, são como palmitos e pretos como o corvo. Se não entendeis, filhas de Jerusalém, nem eu vo-lo saberei explicar; o que vos digo é que os seus cabelos são fortes laços que bastam para prender a todo o Mundo, bastam para abrasar tudo de amor. Ai! amado do meu coração, se as admirações do que sois abrasam a alma, que vos vê por enigmas, que será quando vos vir claramente! Os seus olhos são como pombas sobre correntes de águas, mansos, puros, suaves, benignos, amorosos. Que majestosos, que humildes, que graves, que serenos, que doces, que suaves! Oh dulcíssimo amor, já que tanto fechais os olhos para não serem vistos, ao menos não os fecheis para me não verem! As suas faces são como canteiros de flores aromáticas, sempre belas, sempre cheirosas; passam os dias, os meses e os anos, e os séculos, e as faces do meu amor sempre são flores, nem o sol as murcha, nem o frio as corta, nem a água as corrompe, nem o vento as desfolha; são rosas, são açucenas, são brancas e encarnadas. Oh! quem me dera uma gota da água que as rega, um grão do calor que as vivifica; quem me dera que o Jardineiro que as compõe me quisera semear umas
flores no meu jardim e tomar à sua conta compô-las e regá-las, que o meu amado gosta muito de flores. Dizei-me, aves do ar, flores do campo, peixes do mar, viventes da Terra, dizei-me se sabeis onde assiste este jardineiro. Mas que digo, se este mesmo é o amado a quem busco e não mereço achar! Ó saudade ardente, ó sede matadora, ó seta penetrante, ó amor escondido! Que fareis, Senhor, que fareis, se o vosso empenho é ser amado, porque a minha ventura está em vos ter amor, como escondeis o mesmo que me havia de enamorar? Os seus lábios são lírios, que destilam mirra excelente, lírios de pureza de onde saem palavras que inflamam no amor da mortificação. Oh! se fora tão ditosa minha alma que recebera alguma parte da mirra que destilam teus lírios! Oh! se foram tão felizes meus olhos que viram a engraçada cor de tais lábios! Onde estais escondido, amado do meu coração? Não saem por esses lábios as palavras com que andais chamando pelas ruas, fortalezas e muros da cidade: algum é pequenino venha para mim? Logo, como vos escondeis desta pequenina pobre e necessitada que com tanto empenho vos busca? Suas mãos são como de ouro feitas ao torno e cheias de jacintos, todas perfeitas, todas preciosas; mas reparai, filhas de Jerusalém, e por aqui vos será mais fácil conhecê-lo, que, no meio do ouro e jacintos, tem em cada mão um precioso rubi que a passa de uma para a outra. O seu peito e entranhas são de marfim ornadas de safiras, dando a conhecer a cor celeste da safira, a branca do marfim e sua dureza, que os seus afectos são puras, cândidos, castos, virginais, fortes, celestiais e divinos, sinceros, compostos, sólidos e constantes. Ó peito de amor, entranhas de piedade, como assim vos fechais para quem vos ama? Aqui deve de haver mistério! Gostais talvez de me ver aflita para provar se sou amante! Quereis que me custe muito o que muito vale, porque, se o lograr a pouco custo, farei talvez pouco caso do que não tem preço. Mas ai, amado meu, que, se me não dizeis onde passais a sesta ao meio-dia, temo que, andando vagabunda, venha a cair nas mãos dos vossos contrários! A sua aparência é como a do Líbano, a sua composição como a do cedro; em Judeia o monte mais formoso é o Líbano, no Líbano a árvore mais excelente é o cedro: assim é o meu amado entre os filhos dos homens. A sua garganta é suavíssima, porque saem por ela as vozes, as respirações do peito, que é arquivo de amores e suavidades; enfim, todo é formoso, todo perfeito, todo amável. Tal é o meu amado, este é o meu amigo, filhas de Jerusalém, criaturas da Terra; se o achardes, dizei-lhe que morro de amor...
Marta dizia a oração em voz alta, em modulações cantadas, num arroubamento de preghiera. Aqueles dizeres, alinhavados pelo varatojano, são extractos e imitações das escandecências eróticas do poema dramático da Sulamita no – os trechos mais liricamente sensuais da antiguidade hebraica. Eles deram o tom de todas as exaltações nevróticas, desde os êxtases histéricos de Teresa de Jesus até às alucinações da beata Maria Alacoque e da portuguesa madre Maria do Céu, a cantora dos passarinhos de Vilar de Frades. Desta peçonha doce, elanguescente, vibrátil e enervante, cheia de meiguices epidérmicas de um corpo nu em frouxéis de arminhos, é que se fizeram uns Manuais modernos em França por onde as adolescentes principiam a conversar com Jesus e a compreendê-lo em linhas correctas, sob plásticas macias, a esperá-lo, a desejá-lo, como lho figuram com todas as pulsações, redondezas e flexibilidades da carne.
Marta, entre o Deus incompreensível e o Cristo-homem, via um ser tangível, o seu único termo de comparação – o José Dias, esposo da sua alma e dominador dos seus nervos reacendidos e abraseados pela saudade. Nas apóstrofes a Jesus, palpitavam-lhe nítidas as curvas do amante que a ouvia de entre as nuvens, numa clareira azul, com a sua lividez marmórea e os anéis dos cabelos louros esparsos como nas cabeças dos querubins. Tinha aquele namoro no Céu quando abria a página do livro com que o confessor lhe dissera que havia de exorcizar as tentações voluptuosas da sua alma e do seu corpo.

Contos do Sábado na Usina: Olavo Bilac: COMO A PESCADA...:



Casados há três meses, — já o arrufo, já o ciúme, já a resigna... E Clélia quer que o marido, o Álvaro, lhe ponha já para ali toda a verdade: se foi de fato noivo de Laura, e porque é que foi expulso da casa de Laura, e porque não casou com Laura, e porque é que a família de Laura lhe tem tanta raiva... 
— Mas, filhinha, sê sensata; não nos casamos? Não somos felizes? Não te amo como um louco? Que queres mais? Beijemo-nos que me importa a mim a lembrança de Laura, se é a ti que amo, se te pertenço, se sou o teu maridinho carinhoso? — suspira Álvaro, procurando com os lábios ansiosos os lábios da arrufada Clélia... 
— Não, senhor! Não, senhor! — diz a teimosa, repelindo-o — Não, senhor! quero saber tudo! vamos a isso! foi ou não foi noivo de Laura? 
— Ai! — geme o marido — já que não há remédio... fui, queridinha, fui... 
— Bem! e porque não casou com ela? 
— Porque... porque o pai preferiu casá-la com o Borba, comendador Borba, sabes? aquele muito rico e muito sujo, sabes? 
— Sei... Mas isso não explica o motivo porque o pai de Laura tem tanto ódio ao senhor... 
— É que... é que, compreendes... tinha havido tanta intimidade entre mim e a filha dele... 
— Que intimidade? vamos, diga tudo! o senhor costumava ficar sozinho com 
ela? 
— Às vezes, às vezes... 
— E abraçava-a? 
— Às vezes... 
— E beijava-a? 
— Às vezes... 
— E chegava-se muito para ela? 
— Sim, sim... Mas não falemos nisso! que temos nós com o passado, se nos 
amamos, se estamos casados, se... 
— Nada! nada! — insiste Clélia — quero saber tudo, tudo! vamos! e depois? 
— Depois? mais nada, filhinha, mais nada... 
Clélia, porém, com um brilho singular da curiosidade maliciosa nos grandes olhos azuis, insiste ainda: 
— Confesse! Confesse! Ela... ela não lhe resistiu? Não é assim? 
— Diga-o! Confesse! — e abraça o marido, adulando-o... 
— Pois bem! é verdade! — responde ele — mas acabou, passou... Que importa o que houve entre mim e Laura, se nesse tempo ainda eu não te conhecia, a ti, tão pura, a ti, tão boa, a ti que, enquanto foste minha noiva, nem um só beijo me deste? 
Clélia, muito séria, reflete... E, de repente: 
— Mas, escuta, Alvaro! Como foi que o pai soube? 
— Por ela mesma, por ela mesma! A tola contou-lhe tudo... 
— Ah! Ah! Ah! — e Clélia ri como uma louca, mostrando todas as pérolas da boca — ah! ah! ah! então foi ela quem... que idiota! Que idiota! ah! ah! ah! Ora já se viu que pamonha? aí está uma cousa que eu não teria feito! — uma asneira em que não caí nunca... 
— Como? Como? — exclama o marido, aterrado — uma asneira em que não caíste?! 
— Mas, certamente, queridinho, certamente! Há cousas que se fazem mas não se dizem... 
E, enquanto Álvaro, acabrunhado, apalpa a testa — lá fora, na rua, ao luar, um violão tange o fado e a voz do fadista canta: 
"Homem que casa não sabe Qual o destino que o espera... Há gente como a pescada, Que antes de o ser já o era..."

Contos do Sábado na Usina: Humberto de Campos: A promessa III:




Seis meses tinham decorrido após a partida do Araçá, quando chegou ao quartel a ordem de aprestar o batalhão. A rebelião no sul havia estalado, assumindo proporções inesperadas pelo governo, e reclamando a remessa, para a região conflagrada, de novas unidades militares. Vários regimentos haviam sido já dizimados, de um lado, e de outro. Os feridos enchiam os hospitais, pondo um forte cheiro de sangue na atmosfera. 
E o batalhão partiu. 
Doze dias depois, estavam as forças de que era um dos componentes acampadas nas vizinhanças de uma pequena cidade do interior, na zona de guerra, quando o João Vicente recebeu, com a sua companhia, munição de combate. Em torno do corpo, nos bolsos do cinturão forte, os cartuchos punham um peso novo, que, no entanto, pouco o afligia. E eram nove horas da manhã quando o batalhão, após uma pequena marcha de dois quilômetros, teve ordem de desalojar os rebeldes de uma trincheira, entre o serrote e o rio. 
Sob a fuzilaria do inimigo, e, principalmente, sob o fogo de uma metralhadora mascarada por um monte de pedras, o batalhão investiu, a peito descoberto. Dois companheiros ficaram no chão, feridos. A uma ordem de comando, os soldados deitaram-se, e começou a avançada 
lenta, morosa, ventre na terra, o queixo arrastando na grama, avançada de répteis, de animais coleantes, cuspindo fogo pelo cano escuro dos fuzis. 
Dentes cerrados, olhos ardentes, a mão crispada na arma, carregando -a e descarregando-a continuamente, João Vicente avançava, palmo a palmo, sob o fogo do inimigo. À grande fila que se formara no instante da investida tornava-se cada vez mais curta e mais rala. As balas zuniam sobre a sua cabeça como uma agulha diabólica, que costurasse a atmosfera. Se olhasse para trás, para o caminho percorrido de bruços, desanimaria, talvez, ao ver o campo semeado de corpos, - uns estorcendo-se sob as dores dos ferimentos, outros paralisados, já, pela morte instantânea, os olhos vidrados, a boca escancarada, golfando sangue. João Vicente não sabia, porém, naquele momento, se tinha companheiros, ou se avançava só. A metralhadora estalava na sua frente, como a motocicleta da morte. O seu leque de balas varria tudo. Estava ele, mesmo assim, quase a vinte metros do monte de pedras. Mais dez metros e, se não fosse descoberto, estaria, pela posição, fora do alcance da arma terrível. O suor descia-lhe da testa, cegando-o. Mais cinco metros foram vencidos... Mais três... E outros, ainda. A quatro metros não se conteve mais: abandonando o fuzil, o sabre na mão, deu um salto de tigre, atirando-se, com todo o peso do corpo, como uma bala de canhão, sobre a pilha de granito, que se desmoronou com estrondo para o fosso da trincheira, levando de roldão o assaltante, a metralhadora, e, de mistura, com os blocos de pedra, os dois atiradores que a manejavam! 
Calada por essa maneira a arma que mais os hostilizava, os assaltantes, desprezando a fuzilaria, puseram-se de pé e investiram contra a trincheira, rangendo os dentes. E, em breve, após um curto combate à arma branca, em que homens da mesma pátria se retalhavam, se dilaceravam, se estraçalhavam com fúria sanguinária, tomavam os legalistas posse do reduto, onde o sangue coagulado se misturava, repugnante, entre zumbidos de moscas, com dejeções humanas e com a lama da chuva da véspera. 
Promovido a cabo, João Vicente tomou, ainda, parte em dois combates e em diversos reconhecimentos. Bravo, calmo, destemido, portara-se sempre, em uns e em outros, a contento do comandante, que lhe havia prometido, já, as fitas de sargento. Não era, porém, mais, aquele rapagão claro das serenatas do Araçá. A barba forte, que raspava toda antigamente, tomava-lhe agora o rosto, envelhecendo-o, dando-lhe os ares daqueles cangaceiros do nordeste, que via passar, às vezes, a cavalo, pela vila, com a faca de um lado, a garrucha de outro, e o clavinote na lua da sela. A vida militar absorvera o boêmio. Era, agora, um soldado.

Contos do Sábado na Usina: Machado de Assis: Frei Simão V:

 


O delírio de frei Simão durou alguns dias. Graças aos cuidados, pôde melhorar, e pareceu a todos que estava bom, menos ao médico, que queria continuar a cura. Mas o frade disse positivamente que se retirava ao convento, e não houve forças humanas que o detivessem. 
O leitor compreende naturalmente que o casamento de Helena fora obrigado pelos tios. 
A pobre senhora não resistiu à comoção. Dois meses depois morreu, deixando inconsolável o marido, que a amava com veras. 
Frei Simão, recolhido ao convento, tornou-se mais solitário e taciturno. Restava-lhe ainda um pouco da alienação. 
Já conhecemos o acontecimento de sua morte e a impressão que ela causara ao abade. 
A cela de frei Simão de Santa Águeda esteve muito tempo religiosamente fechada. Só se abriu, algum tempo depois, para dar entrada a um velho secular, que por esmola alcançou do abade acabar os seus dias na convivência dos médicos da alma. Era o pai de Simão. A mãe tinha morrido. 
Foi crença, nos últimos anos de vida deste velho, que ele não estava menos doido que frei Simão de Santa Águeda.