quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Poesia de Quinta na Usina: Paulo Leminsk:

 



um dia desses quero ser um 
grande poeta inglês do século passado
dizer

ó céu ó mar ó clã ó destino lutar na índia 
em 1866 e sumir num naufrágio clandestino

Poesia de Quinta na Usina: Paulo Leminsk: cesta feira:



oxalá estejam limpas
as roupas brancas de sexta as roupas 
brancas da cesta oxalá teu dia de festa
cesta cheia
feito uma lua
toda feita de lua cheia no branco
lindo teu amor
teu ódio
tremeluzindo
se manifesta
tua pompa tanta festa tanta roupa
na cesta cheia
de sexta oxalá estejam limpas
as roupas brancas de sexta oxalá teu dia de festa
mesmo na idade de virar
eu mesmo ainda confundo felicidade com este nervosismo
eu quando olho nos olhos sei quando uma pessoa está por dentro
ou está por fora quem está por fora não segura
um olhar que demora de dentro do meu centro
este poema me olha

Poesia de Quinta na Usina: Paulo Leminsk: desmontando o frevo:


desmontando o brinquedo eu descobri que o frevo
tem muito a ver com certo
jeito mestiço de ser um jeito misto
de querer isto e aquilo
sem nunca estar tranquilo com aquilo
nem com isto de ser meio
e meio ser sem deixar de ser inteiro
e nem por isso desistir
de ser completo mistério
eu quero ser o janeiro a chegar
em fevereiro fazendo o frevo que eu quero 
chegar na frente em primeiro

Poesia de Quinta na Usina: Machado de Assis: LA MARCHESA DE MIRAMARi:

 


 

A misérrima Dido
Pelos paços reais vaga ululando.
Garção
De quanto sonho um dia povoaste
A mente ambiciosa,

Que te resta? Uma página sombria,
A escura noite e um túmulo recente.
Ó abismo! Ó fortuna! Um dia apenas Viu erguer, viu cair teu frágil trono.
Meteoro do século, passaste,

Ó triste império, alumiando as sombras. A noite foi teu berço e teu sepulcro.
Da tua morte os goivos inda acharam
Frescas *as rosas dos teus breves dias;
E no livro da história uma só folha
A tua vida conta: sangue e lágrimas.

No tranqüilo castelo,
Ninho de amor, asilo de esperanças,
A mão de áurea fortuna preparara,
Menina e moça, um túmulo aos teus dias.

Junto do amado esposo,
Outra c’roa cingias mais segura,
A coroa do amor, dádiva santa
Das mãos de Deus. No céu de tua vida
Uma nuvem sequer não sombreava

A esplêndida manhã; estranhos eram
Ao recatado asilo
Os rumores do século.
Estendia-se

Em frente o largo mar, tranqüila face
Como a da consciência alheia ao crime,
E o céu, cúpula azul do equóreo leito.
Ali, quando ao cair da amena tarde,
No tálamo encantado do ocidente,

O vento melancólico gemia,
E a onda murmurando,
Nas convulsões do amor beija a areia,
Ias tu junto dele, as mãos travadas,
Os olhos confundidos,

Correr as brandas, sonolentas águas,
Na gôndola discreta. Amenas flores
Com suas mãos teciam
 Na errata consta Fuscas

As namoradas Horas; vinha a noite,
Mãe de amores, solícita descendo,
Que em seu regaço a todos envolvia,
O mar, o céu, a terra, o lenho e os noivos.

Mas além, muito além do céu fechado,
O sombrio destino, contemplando
A paz*do teu amor, a etérea vida,
As santas efusões das noites belas,
O terrível cenário preparava

A mais terríveis lances.
Então surge dos tronos
A profética voz que anunciava
Ao teu crédulo esposo:

“Tu serás rei, Macbeth!” Ao longe, ao longe, No fundo do oceano, envolto em névoas, Salpicado de sangue, ergue-se um trono. Chamam-no a ele as vozes do destino. Da tranqüila mansão ao novo império Cobrem flores a estrada, — estéreis flores Que mal podem cobrir o horror da morte. Tu vais, tu vais também, vítima infausta; O sopro da ambição fechou teus olhos...
Ah! quão melhor te fora
No meio dessas águas

Que a régia nau cortava, conduzindo
Os destinos de um rei, achar a morte:
A mesma onda os dois envolveria.
Uma só convulsão às duas almas

O vínculo quebrara, e ambas iriam,
Como raios partidos de uma estrela,
À eterna luz juntar-se.
Mas o destino, alçando a mão sombria,

Já traçara nas páginas da história
O terrível mistério. A liberdade
Vela naquele dia a ingênua fronte.
Pejam nuvens de fogo o céu profundo.
Orvalha sangue a noite mexicana...

Viúva e moça, agora em vão procuras
No teu plácido asilo o extinto esposo.
Interrogas em vão o céu e as águas.
Apenas surge ensangüentada sombra

Nos teus sonhos de louca, e um grito apenas,
Um soluço profundo reboando
Pela noite do espírito, parece 
Os ecos acordar da mocidade.

No entanto, a natureza alegre e viva,
Ostenta o mesmo rosto.
Dissipam-se ambições, impérios morrem.
Passam os homens como pó que o vento

Do chão levanta ou sombras fugitivas.
Transformam-se em ruína o templo e a choça.
Só tu, só tu, eterna natureza,
Imutável, tranqüila,
Como rochedo em meio do oceano,

Vês baquear os séculos.
Sussurra
Pelas ribas do mar a mesma brisa;
O céu é sempre azul, as águas mansas;
Deita-se ainda a tarde vaporosa

No leito do ocidente;
Ornam o campo as mesmas flores belas...
Mas em teu coração magoado e triste,
Pobre Carlota! o intenso desespero

Enche de intenso horror o horror da morte.
Viúva da razão, nem já te cabe
A ilusão da esperança.
Feliz, feliz, ao menos, se te resta,
Nos macerados olhos,

O derradeiro bem: — algumas lágrimas!



Poesia de Quinta na Usina: Machado de Assis: SOMBRAS:



Que tienes? que estás pensando
Gloria de mi pensamiento?*
Cervantes*
Quando, assentada à noite, a tua fronte inclinas,

E cerras descuidada as pálpebras divinas,
E deixas no regaço as tuas mãos cair,
E escutas sem falar, e sonhas sem dormir,
Acaso uma lembrança, um eco do passado,

Em teu seio revive?
O túmulo fechado
Da ventura que foi, do tempo que fugiu,
Por que razão, mimosa, a tua mão o abriu?

Com que flor, com que espinho, a importuna memória
Do teu passado escreve a misteriosa história?
Que espectro ou que visão ressurge aos olhos teus?
Vem das trevas do mal ou cai das mãos de Deus?

É saudade ou remorso? é desejo ou martírio? 
Quando em obscuro templo a fraca luz de um círio
 Manteve-se fidelidade ao texto original, 
por isso não se usou o sinal gráfico espanhol.

Apenas alumia a nave e o grande altar
E deixa todo o resto em treva, — e o nosso olhar
Cuida ver ressurgindo, ao longe, dentre as portas,
As sombras imortais das criaturas mortas,

Palpita o coração de assombro e de terror;
O medo aumenta o mal. Mas a cruz do Senhor,
Que a luz do círio inunda, os nossos olhos chama;
O ânimo esclarece aquela eterna chama;

Ajoelha-se contrito, e murmura-se então
A palavra de Deus, a divina oração.
Pejam sombras, bem vês, a escuridão do templo;
Volve os olhos à luz, imita aquele exemplo;
Corre sobre o passado impenetrável véu;
Olha para o futuro e vem lançar-te ao céu.

Poesia de quinta na Usina: Machado de Assis: QUANDO ELA FALA:

 


 



She speaks
O speake again, bright angel!
Shakesp.

Quando ela fala, parece
Que a voz da brisa se cala;
Talvez um anjo emudece
Quando ela fala.

Meu coração dolorido
As suas mágoas exala,
E volta ao gozo perdido
Quando ela fala.

Pudeste* eu eternamente,
Ao lado dela, escutá-la,
Ouvir sua alma inocente
Quando ela fala.

Minha alma, já semimorta,
Conseguira ao céu alçá-la
Porque o céu abre uma porta
Quando ela fala.

poesia de Quinta na Usina: D'Araújo: Beleza:

 




Veja como é bela
A fada que permeia meus sonhos
E incendeia meus desejos.

Que invade meus sentimentos.
Que clareia os meus caminhos mais perversos.
E que me traz de volta um universo de possibilidades,
Com todas as Verdades da minha existência.....

Poesia de Quinta na Usina: D'Araújo: Inverso:



Alma clara, alma nua,

Nua e crua feita à alma tua.

Com um tempo que construa...

Poesia de Quinta na Usina: D'Araújo: Eis que tu és:

 



É meu fel meu céu minha perdição
Minha razão ou inconseqüência
Ou mesmo a minha demência
A esperança de um futuro inexistente.

Eis a doença que não cura a loucura do irreal.
Eis que tu és a vida que não vem à morte que nunca chega
A felicidade que não se alcança a eterna dança
Da alma vadia, ou até mesmo
A alegria tardia.

Eis o sonho em desarmonia que nunca cessa......