quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Poesia de Quinta na Usina: D'Araújo: Amazônia:



Enfileirados em busca de harmonia e equilíbrio

Ouvimos os inevitáveis gritos

Que ecoam da nossa imensa floresta

Tentando salvar o que lhe resta de esperança

Da eterna dança da alma do mundo.

 

Sendo consumida pelas chamas

Da hipocrisia nossa de cada dia.

Onde a cultura do destruir é mais valiosa

Do que o plantar de um novo sonho.

 

E entre lágrimas e sussurros de dor

Da incapacidade de renascer a cada dia

Só lhe resta a imensa agonia

Do ronco dos motores

A alastrar as dores da devastação.

 

Ao som das canções dos ventos,

Esperamos novamente um momento

Em que nos traga a paz de nascer, crescer e morrer

Apenas com a ação do inevitável tempo.

Poesia de Quinta na Usina: D'Araújo: Eu vejo o mundo:



Eu vejo o mundo, assim o mundo eu vejo.

Sob o falso brilho dos azulejos.

Azulejos de paredes tortas de colunas pensas.

 

Eu vejo o mundo que não pensa.

Um mundo que não admite seus erros

Mas ninguém vê o mundo como eu vejo.

 

Um mundo de hipocrisia e de agonia

Olha como eu vejo mundo.

Um mundo ao qual espero

Que um dia você também veja.

 

Um mundo feito caranguejo

Que só anda prá trás sem contar desejos.

Assim o mundo eu vejo...

Poesia de Quinta na Usina: D'Araújo: O grito:





Então nós não vamos fazer nada.
A truculência vencendo o bom censo.
A violência estampada na cara
De cada um de nós.

Até quando vão tombar,
Manoel, João e Joaquim?
Até quando os eleitos vão ficar
Trancados em seus palacetes
A ignorar a realidade que os cercam.

Até quando vamos blindar nossas fortalezas
Enquanto os filhos da corrupção em seus barracões
Tramam mais uma ação?

Será que todos eles vão fechar os olhos
E entupir os próprios ouvidos
Com os dólares da nação
Enquanto mais um nos semáforos da vida
Estende-nos a mão.

E todos nós com aquele olhar superior 
não Chegamos a enxergar sequer a dor 
daquele que não vê amor
E sim a dor do abandono.

Até quando vamos assistir
A meia dúzia de hipócritas
Levar o sonho de nossas crianças
Pelo ralo do poder?

E todos nós tendo que nos esconder de nós mesmos.
Até quando você vai ficar aí parado
Sem ter a coragem de sequer olhar pro lado?
Olhe, veja, fale grite, se faça ouvir, porque o futuro, e hoje é aqui.

Poesia de Quinta na Usina: Laurindo Ribeiro: O meu segredo II:





Mandado do inferno
Por ímpio destino,
Um gênio mali’no
No berço me viu —

E após um instante
Haver-me encarado
Com gesto irritado,
O Gênio — o meu fado

Traçando — sorriu.
Sorriu-se... e mudados
No mesmo momento
Que o Gênio cruento,

Cruento me viu,
Em negra tristeza,
Meus gostos findaram;
Meus lábios murcharam;

Meus ais começaram;
Meu pranto caiu.
No peito inda verde
Secou-se a ventura

Daquela fé pura
Que a infância nos dá;
No espelho onde via
Em êxtase santo



Os risos, o encanto,
De um mundo, que há tanto
Não sei onde está.
Em dita tão pura

Minh’alma exultava,
E quanto alcançava
Sabia explicar;
Que, além de dar crença

A tudo que ouvia,
Por certa magia,
As cousas que via,
Sentia falar.

Se às vezes tentava
Brincar com as flores,
Revendo os lavores
De um vasto jardim,

A brisa me dava,
No trânsito leve,
Um cântico breve,
Escrito na neve

De um casto jasmim.
Fugaz borboleta
Nas asas de ouro
Imenso tesouro

Deixava-me ver;
E, qual um avaro,
Sedento, inquieto,
Com ardido afeto

Atrás do inseto
Me punha a correr.
Qual boca de ninfa
Há pouco desperta,

Se rosa entreaberta
Prendia louçã,
Segredos da infância
A flor me contava,

Q’eu só escutava,
E, rindo, exclamava: —
Tu és minha irmã!...
À vista do oceano, Imenso, ruidoso,

Que quadro assombroso Fez meu ideal!...
Em êxtase, longo Vi nele espantado,
Rugindo deitado, Um monstro azulado 
D’enorme cristal.

Em crua e constante,
Horríssona guerra,
In’migo da terra,
Pintou-se-me o mar —

Que fero co’as ondas
Na praia batia,
E aflito bramia,
Porque não podia

A praia arredar.
Na concha celeste
Se os olhos fitava,
Lá novos achava

Encantos também;
Nos astros eu via
De anjinhos um bando,
Que, o corpo ocultando,

Me estavam olhando
De um mundo de além.
Eu via na lua
A casa encantada,

De luz prateada
Fugindo no ar;
Asilo somente
Da fada querida,

Que vinha escondida
A gente nascida
De noite embalar.
O sol eu amava

Da tarde na hora;
Amava-o d’aurora
No fresco arrebol.
E quando a tais horas

No mar se escondia,
P’ra ele me ria,
Julgando que via
Adeuses do sol.

Poesia de quinta na Usina: Laurindo Ribeiro: O MEU SEGREDO I:





O lume de sinistro fogo estranho
Que em meu olhar se acende;
A nuvem que de mágoas carregada
No rosto se me estende;

Esta agonia acerba que repassa
Os sons da minha lira;
Este céptico altivo horror ao mundo
Que em tudo meu respira;

Estas rugas, que trago sobre as faces,
Os modos distraídos,
A constante desordem do semblante,
Dos gestos, dos vestidos;
Revela tudo um segredo,

Que o mundo não sabe ler;
Segredo, que só com pranto
É que se pode escrever;
Segredo, que em meu futuro
Negro anátema cuspiu;

Segredo, que seduziu-me;
Segredo que me traiu.
Letras escritas com pranto
Sei que apagadas serão!

Sei que um segredo de mágoas
Nunca merece atenção!
Mas não importa; hoje quero
O meu segredo escrever;
Que guardado por mais tempo
Talvez me faça morrer.

Poesia de Quinta na Usina: Laurindo Ribeiro: O QUE SÃO MEUS VERSOS:

 


 



Se é vate quem acesa a fantasia
Tem de divina luz na chama eterna;
Se é vate quem do mundo o movimento
C’o movimento das canções governa;

Se é vate quem tem n’alma sempre abertas
Doces, límpidas fontes de ternura,
Veladas por amor, onde se miram
As faces da querida formosura;

Se é vate quem dos povos, quando fala,
As paixões vivifica, excita o pasmo,
E da glória recebe sobre a arena
As palmas, que lhe of’rece o entusiasmo;

Eu triste, cujo fraco pensamento
Do desgosto gelou fatal quebranto;
Que, de tanto gemer desfalecido,
Nem sequer movo os ecos com meu canto;

Eu triste, que só tenho abertas n’alma
Envenenadas fontes d’agonia,
Malditas por amor, a quem nem sombra
De amiga formosura o céu confia;

Eu triste, que, dos homens desprezado,
Só entregue a meu mal, quase em delírio,
Ator no palco estreito da desgraça,
Só espero a coroa do martírio;

Vate não sou, mortais; bem o conheço;
Meus versos, pela dor só inspirados, —
Nem são versos — menti — são ais sentidos,
Às vezes, sem querer, d’alma exalados;

São fel, que o coração verte em golfadas
Por contínuas angústias comprimido;
São pedaços das nuvens, que m’encobrem
Do horizonte da vida o sol querido;

São anéis da cadeia, qu’arrojou-me
Aos pulsos a desgraça, ímpia, sanhuda;
São gotas do veneno corrosivo,
Que em pranto pelos olhos me transuda.

Seca de fé, minha alma os lança ao mundo,
Do caminho que levam descuidada,
Qual, ludíbrio do vento, as secas folhas
Solta a esmo no ar planta mirrada.

Poesia de Quinta na Usina: Fagundes Varela: ILUSÃO:







Sinistro como um fúnebre segredo
Passa o vento do Norte murmurando
Nos densos pinheirais;
A noite é fria e triste;
solitário Atravesso a cavalo a selva escura
Entre sombras fatais. 

À medida que avanço, os pensamentos 
Borbulham-me no cérebro, ferventes,
Como as ondas do mar,
E me arrastam consigo, alucinado,
À casa da formosa criatura De meu doido cismar.
Latem os cães; as portas se franqueiam

Rangendo sobre os quícios; os criados
Acordem pressurosos;
Subo ligeiro a longa escadaria,
Fazendo retinir minhas esporas
Sobre os degraus lustrosos.
No seu vasto salão iluminado,

Suavemente repousando o seio
Entre sedas e flores,
Toda de branco, engrinaldada a fronte,
Ela me espera, a linda soberana
De meus santos amores.

Corro a seus braços trêmulo, incendido
De febre e de paixão... A noite é negra,
Ruge o vento no mato;
Os pinheiros se inclinam, murmurando:
- Onde vai este pobre cavaleiro Com seu sonho insensato?...

Poesia de Quinta na Usina: Fagundes Varela: SONETO:



Desponta a estrela d’alva, a noite morre.

Pulam no mato alígeros cantores,

E doce a brisa no arraial das flores

Lânguidas queixas murmurando corre.

 

Volúvel tribo a solidão percorre

 

Das borboletas de brilhantes cores;

Soluça o arroio; diz a rola amores

Nas verdes balsas donde o orvalho escorre.

 

Tudo é luz e esplendor; tudo se esfuma

 

Às carícias da aurora, ao céu risonho,

Ao flóreo bafo que o sertão perfuma!

 

 

Porém minh’alma triste e sem um sonho

 

Repete olhando o prado, o rio, a espuma:

-   Oh! mundo encantador, tu és medonho!

Poesia de Quinta na Usina: Fagundes Varela: Soneto: NAPOLEÃO:



Sobre uma ilha isolada,

Por negros mares banhada,

Vive uma sombra exilada,

De prantos lavando o chão;

E esta sombra dolorida,

No frio manto envolvida,

Repete com voz sumida:

- Eu inda sou Napoleão.

 

Tremem convulsas as plagas

 

Bravias lutam as vagas,

Solta o vento horríveis pragas

Nos cendais da escuridão;

Mas nas torvas penedias


2

 

Entre fundas agonias,

 

Ela diz às ventanias:

-   Eu inda sou Napoleão.

 

-   E serei! do céu da glória, Nem dos bronzes da memória, Nem das páginas da história Meus feitos se apagarão; Passe a noite e as tempestades, Venham remotas idades, Caiam povos e cidades,

 

-   Sempre serei Napoleão.

 

Da coluna de Vendôme,

 

O bronze, o tempo consome,

Porém não apaga o nome

Que tem por bronze a amplidão.

Apesar de infausto dia,

Da infâmia que tripudia,

Dos bretões a cobardia,

- Sempre serei Napoleão.

 

Nos vastos plainos do Egito,

 

Sobre Titães de granito,

Eu tenho um poema escrito

Que deslumbra a solidão.

Das Ísis rasguei os véus,

Entre os altares fui deus,

Fiz povos escravos meus,

- Ah! inda sou Napoleão.

 

Desde onde o crescente brilha

 

Até onde o Sena trilha,

Tive o mundo por partilha

Tive imensa adoração;

E de um trono de fulgores

Fiz dos grandes - servidores,

Fiz dos pequenos - senhores,

- E sempre fui Napoleão.

 

Quando eu cortava os desertos,

 

Vinham-me os ventos incertos

De incenso e mirra cobertos

Lamber-me as plantas no chão;

As caravanas paravam,

E os romeiros que passavam

Às solidões perguntavam:

- É este o deus Napoleão?

 

E lá nas plagas fagueiras,

 

Onde as brisas forasteiras,


3

 

Entre selvas de palmeiras

 

Corre o sagrado Jordão,

O lago dizia ao prado,

O prado ao monte elevado,

O monte ao céu estrelado:

- Vistes passar Napoleão!

 

Dizei, auras do Ocidente,

 

Dizei, tufão inda quente

Do bafejo incandescente

Do não vencido esquadrão,

Como é ele? é belo, ousado?

Tem o rosto iluminado?

Tem o braço denodado?

- Sempre é grande Napoleão?

 

E as águias no céu corriam,

 

E os areais se volviam,

E horrendas feras bramiam

No imenso da solidão;

Mas as vozes do deserto

Se erguiam como um concerto

E vinham saudar-me perto:

-   Tu és, senhor, Napoleão!

 

-   Se sou! que Marengo o conte, De Austerlitz o horizonte,

E aquela soberba ponte Que transpus como o tufão! E a minha vida de Ajácio, E o meu sublime palácio, E os pescadores do Lácio Que só dizem - Napoleão!

 

Se o sou! que digam as plagas,

 

Onde do sangue nas vagas,

Coberta de enormes chagas

Dorme vil população;

Digam da Ásia as bandeiras,

Digam longas cordilheiras,

Que se abatiam, rasteiras,

Ao corcel de Napoleão!

 

Se o sou! diga Santa Helena

 

Onde a mais sublime cena

Fechou tranqüila e serena

Minha história de Titão,

Digam as ondas bravias,

Digam torvas penedias,

Onde as rijas ventanias

Vêm murmurar: - Napoleão.


4

 

 

E serei! do céu, da glória,

 

Nem dos bronzes da memória

Nem das páginas da história

Meus feitos se apagarão!

Assim na rocha isolada

Pelas espumas banhada,

Disse a sombra desterrada,

De prantos lavando o chão.

 

As névoas rolam nos céus,

 

Da noite escura nos véus

Soltam negros escarcéus

Rugidos de imprecação;

Mas das sombras a espessura

A face da onda escura,

O salgueiro que murmura

Tudo fala - Napoleão!

Quarta na Usina: Poetisas da Rede: Lilian Menale: ALDRAVIA - PRIMAVERIL:





beija-flor

no

jardim

conquista

a

flor

...

botões

de

rosas

vermelhas

desabrocham

encantam

...

primavera

com

beleza

traz

perfume

inebriante

Lilian Menale

Codinome Uma Mulher Um Poema

Direitos autorais reservados.

http://umamulherumpoema.recantodasletras.com.br/

Deus nos abençoe e proteja todos os dias!!!

Quarta na Usina: Poetisas da Rede: Léa Marinho: TEM MUITA GENTE ASSIM:



Que só procura a gente,

Quando está sozinho,

Que só liga pra gente,

Quando quer carinho,

Mas nem tenta disfarçar,

O seu lado egoísta,

Inventando histórias,

Parece um artista!

E quando a gente reclama,

Diz que não tem nada a ver,

Que foi só um deslize,

Não vai mais acontecer,

Mas acontecerá,

Fim de semana taí,

Tudo é mais importante,

Do que a gente aqui!

Então, valorize quem te procura,

Dê um pouco de atenção,

Seja menos egoísta,

Tenha mais consideração!

Léa Marinho

Quarta na Usina: Poetisas da Rede: Fernanda Rocha: PERDI-ME:

Perdi-me....!

Na voragem do tempo

Na névoa da cidade

Nos olhos das gentes

Na eterna saudade.

Perdi-me...!

Quando não se sabe nada

E a confusão é tão grande

Que se fica de repente

Sem se saber se se é gente

Ou algo pouco importante

Perdi-me...

Sim, perdi-me....!

De mim, dos outros,....de ti....

Da vida

Que devia ser vivida

Mas que afinal não vivi

E nesse preciso instante

Morri !



Fernanda  Rocha

´

Óleo s/tela

Quarta na Usina: Poetisas da Rede: Ema Machado: Chuva primaveril:



Ela chegou devagarinho

Cuidadosamente rega

Como mãe, ao banhar seu bebezinho

Não quis desfazer flores

Sedentas a sua espera

Germinaram, antecedentes a primavera

Acaricia o solo ardente

Refrigerou o ar quente

Beija a nascente

Devolve a vida até quem já murchou

Chuva límpida, menina

Lava sem reservas

É mãe que cuida da terra

Assim desperta a primavera...

Ema Machado

Imagem de Ilona Ilyés por Pixabay.