sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Aberto a todos os interessados - #Poesias:



 - Aberto a todos os interessados - #Poesias - Inscrição pessoalmente ou por correios Premiação: - Prêmios em dinheiro Prazo: 26 de agosto de 2022 Organização: Município de Campo Mourão Fundação Cultural | Biblioteca Pública Municipal Prof. Egydio Martello Contato - Mais informações e Dúvidas:...

http://concursos-literarios.blogspot.com/

Escrita Selvagem: Concursos Literários:


 

Concursos literários são ótimas oportunidades de ter o seu original avaliado e receber prêmios em dinheiro ou até mesmo contratos de publicação com editoras. São muitas opções em editais para romances, poesias, crônicas e contos, dos mais diversos gêneros literários e tipos de escritores. Descubra opções de concursos gratuitos, de publicação em mídia física ou digital, com premiações em dinheiro, recebimento de certificados especiais e até mesmo com tudo inclusivo para evento de lançamento.Tome nota das informações e descubra se o edital pede taxa de inscrição, custos adicionais como frete para recebimento das obras e também se sua obra deve ser inédita.

https://escritaselvagem.com.br/concursos-literarios/

A Literarte abre oportunidade a todos os autores de língua Portuguesa:


 

Vamos pra mais uma antologia gratuita? Desta vez aberta a todos escritores lusófonos.

A Literarte abre oportunidade a todos os autores de língua Portuguesa. A publicação vai correr o país, mas atenção as Regras.....

https://www.facebook.com/grupoliterarte

Ficha de Inscrição:

https://docs.google.com/.../1FAIpQLSdwCyP2s4t.../viewform...

Editora Literarte promove a Antologia *ACADÊMICOS DA ALAF E CONVIDADOS 2022:




REGULAMENTO

PARA QUEM DESEJA ENVIAR

SEUS POEMAS, PROSAS OU CONTOS

*Faça Parte! Junte-se a nós!*
INSCRIÇÕES ATÉ 01 de SETEMBRO de 2022
☆ Realizar inscrição no formulário estabelecido
Com o intuito de divulgar os Acadêmicos efetivos e correspondentes da ALAF ( ACADEMIA DE LETRAS E ARTES DE FORTALEZA, junto aos autores dos demais estados brasileiros e países lusófonos, a
Editora Literarte promove a Antologia *ACADÊMICOS DA ALAF E CONVIDADOS 2022 *
● REGULAMENTO
Esta obra será regida pelo seguinte regulamento:
1- Tema Livre
2– Podem participar autores de todos os estados brasileiros e países lusófonos que façam
parte da ALAF ( ACADEMIA DE LETRAS E ARTES DE FORTALEZA ) e autores convidados que desejarem publicar seus trabalhos literários que escrevam em língua portuguesa.
Participem também da ALAF( Academia de Letras e Artes de Fortaleza) para acompanharem as divulgações!
3- Os poemas, prosas ou contos devem ser inéditos (não
publicados em livros) ou já publicados e escritos em língua portuguesa.
4- Os autores podem enviar DOIS POEMAS, PROSA OU CONTO com máximo de DUAS laudas.
(Título e espaços incluídos)
DUAS laudas por participação e UMA LAUDA para Biografia RESUMIDA.
5- O Acadêmico ou autor que fizer uma indicação ganhará mais UMA LAUDA para publicar mais UM poema.
6 - Todos os textos devem ter um título diferente do nome da Antologia.
7 - Os arquivos dos textos devem ser anexados no formato word, letra Times New
Roman - tamanho 12 no formulário.
8- Deverá ser anexado três arquivos ao formulário, os dois arquivos de 2 poemas ou um só arquivo sendo conto correspondentes a DUAS laudas.
9- O formulário deverá ser preenchido com todos os itens pedidos sobre o autor para divulgação. Item importante para a participação e inclusão na Antologia, além de aprovação dos textos ou poemas.
10 - Todos os textos enviados serão sujeitos a uma pré-avaliação,
sobre a criatividade e qualidade, regida pelos critérios da
Literarte, que informará todos os autores.
11- Todos os textos para esta Antologia a revisão é de
responsabilidade do autor.
12– Os poemas, prosas ou contos devem ser enviados até dia
01 de SETEMBRO de 2022.
13– O valor por participação da ANTOLOGIA, devido ao aumento dos
custos gráficos e envio via correios, devido a pandemia (covid -19):
4 LIVROS + TAXA DOS
CORREIOS = R$ 300,00 (Trezentos Reais).
IMPORTANTE: Enviamos os livros para os endereços informados. Após a
postagem nos correios não nos comprometemos com extravios dos correios ou
erros enviados pelos autores.
14- O depósito deve ser feito até 01 de Setembro após a
aceitação do(s) poema(s), no número do pix informado que
será enviado , ficando a presidente a
aguardar confirmação mediante comprovante enviado via watsaap (a não confirmação do depósito estabelece a exclusão
da participação)
15 - Cada exemplar extra incluindo despesas
postais fica por R$ 30,00 (cada).
16–O lançamento previsto será na Bienal Internacional do Livro da Bahia que será realizada nos dias 10 a 15 de Novembro de 2022 no Centro de Convenções de Salvador (sujeito às
determinações do governo da Bahia devido a pandemia
covid-19). O Lançamento da Antologia da ALAF será especificamente dia 11 de Novembro ( sexta-feira).
17 - Os autores são responsáveis pela autenticidade dos textos
enviados e responderão perante a lei do plágio, cópia indevida ou
qualquer outro crime relacionado com o Código dos Direitos de Autor.
18- O envio dos poemas pressupõe o conhecimento e aceitação de
todos os pontos deste regulamento.
19 - Na eventualidade do surgimento de alguma situação omissa
neste regulamento, a decisão sobre as medidas a serem tomadas
será da Associação Internacional de Escritores e Artistas- LITERARTE.
☆ ALAF ( ACADEMIA DE LETRAS E ARTES DE FORTALEZA)
Presidente: Mardenia Maria
APOIO:
☆ LITERARTE- Associação Internacional de Escritores e Artistas.
Presidente : Izabelle Valadares.

Caso se escreva poderia mencionar por indicação de Antonio de Araújo Silva por gentileza.

Contos do Sábado na Usina: Camilo Castelo Branco:

 


VII

 

Às sete da noite, a soirée do monarca de Calvos compunha-se do visconde Nunes, seu secretário privado e brigadeiro de infantaria, do abade capelão-mor de el-rei, de dois reitores, cónegos despachados, e o ex-sargento-mor de Rio Caldo, nomeado capitão-mor de Lanhoso. Estavam todos em pé resistindo à licença de se sentarem. A cadeira de sola estava com o príncipe encostada ao relógio; e, na mesa central, papéis, o tinteiro de chumbo, o Novo
Príncipe, de Gama e Castro, a Besta Esfolada e o Punhal dos Corcundas, do bispo Frei Fortunato. Em cima das caixas do milho estava uru meio alqueire com feijões brancos, destinados às tripas, e dois foles vazios que a Senhorinha tencionava encher de grão para a fornada quando el-rei se recolhesse. Sobre um dos foles resbunava um gato enroscado.
Esperava-se o apresentante da carta de Vasco da Cerveira.
Às oito horas anunciaram-se os adventícios. O barão de Bouro entrou primeiro, a passo mesurado, com o peito alto, e o pescoço hirto numa gravata enchumaçada, preta, de cordãozinho de arame, sem laço, atacando os lóbulos das orelhas, um pouco reentrante na altura dos gorgomilos. Usava óculos de ouro quadrados e uma pêra grisalha; de resto, rapado. Envergava casaca nova de lemiste, muito refestelada, de abas compridas com ancas proeminentes, segundo a moda; do cós das calças, cor de gema de ovo, pendiam berloques com armas, uma medalha com o retrato de D. Miguel aos vinte e dois anos, e uma peça de ouro com a mesma real efígie. No peito da camisa, entre as lapelas do colete de veludo cor de laranja, trazia pregado um punhal esmaltado, em miniatura, enigma convencional dos cavaleiros de S. Miguel da Ala, obra patriótica do ourives Novais, pai do poeta Faustino.
Após ele, entrou o Zeferino das Lamelas, muito enfiado, num espasmo, sentindose aluir pelos joelhos. Ia de niza de pano azul com botões amarelos, calça branca espipada com joelheiras pelos atritos do albardão. As pernas das calças chegavam apenas a meio cano das botas, que pelo tamanho dos pés dir-se-iam roubadas a um gigante.
O Bezerra dobrou o joelho, inclinando o tronco à mão esquiva de Sua Majestade. Por detrás dele, o Zeferino ajoelhara batendo com ambas as rótulas no tabuado. O barão ia falar, quando o rei, reparando no outro, disse:
– Levante-se, homem. Isto aqui não é capela.
O pedreiro teimava, achava-se bem naquela postura que o dispensava de procurar outra.
– Sua Majestade manda-o levantar– disse o visconde Munes.
Ergueu-se, e num ímpeto silencioso ia entregar a carta ao da cadeira, quando o capelão-mor lhe observou que as cartas se entregavam ao secretário.
O barão expôs que não pudera resistir aos pedidos que aquele honrado legitimista lhe fizera para o acompanhar, porque não se atrevia a entrar sozinho à presença de elrei, seu amo. Que era filho de um bravo alferes, o Gaspar das Lamelas, que, em 1838, à frente de 300 homens, atacara a vila de Santo urso, dando vivas a el-rei. Contou a façanha de atravessar o Ave a nado em Janeiro, com a espada nos dentes, e que por causa disso entrevecera e nunca mais se levantou.
– Oh! – interjeccionou compungidamente o monarca. – Eu ignorava esse notável ataque... estava em Roma, sem notícias... Digno homem o meu honrado e bravo... como se chama seu pai?
– Saberá Vossa Majestade que se chama Gaspar Ferreira. E o rei:
– Visconde, escreva na lista.
O Nunes sentou-se à mesa, pedindo vénia a Sua Majestade, que ditou:
– Gaspar Ferreiro, reformado em coronel de infantaria, com vencimento desde 1838. Escreva à margem:
Batalha de Santo Tirso. – E voltando-se para Zeferino, que ladeava para a parede:
– Diga a seu bravo pai que lhe dei a reforma em coronel, e vencerá soldo dos sete anos passados. O Zeferino abriu a boca para dizer o que quer que fosse.
– A carta do meu velho amigo Teixeira? – perguntou o rei ao visconde Nunes.
– Cerveira, perdoe Vossa Majestade, Cerveira Lobo.
– Ah! sim... Cerveira Lobo.
Abriu, leu para si, passou a carta ao secretário, e comentando exultante:
– Um grande amigo! dos raros! um dos nossos melhores esteios! Com homens assim dedicados, o triunfo é certo. Posso dizer com o grande vate Camões:
E dir-me-eis qual é mais excelente Se ser do mundo rei, se de tal gente.
Um dos reitores que estavam na penumbra, lá em baixo ao pé das caixas, olhou com espanto para o outro, que lhe disse à puridade, discretamente:
– Diz que ele tem estudado o diabo.. até o latim! El-rei prosseguiu:
– Vou responder por meu próprio punho ao meu nobre amigo. É digno desta e de maiores considerações.
Visconde, escreva na lista: Vasco da Cerveira Lobo, general de cavalaria, e conde de Quadros.
Depois, tirou de uma velha pasta de papelão uma folha de almaço, sentou-se a escrever – e que conversassem.
O abade, capelão-mor, aproveitou o ensejo para servir vinho do Douro e pastéis de Guimarães, cavacas do convento dos Remédios e forminhas.
Havia mastigação de mandíbulas pesadas; as forminhas eram frescas, muito torriscadas, davam rangidos numa trincadeira voluptuosa. Conversava-se em dois grupos. O sargento-mor de Rio Caldo contava passagens de caça no Gerês, com enfáticos arremedos, movimentados, de altanaria. Que o porco-bravo viera direito a ele, e
cortava mato, troncos de giestas como a sua coxa – e mostrava –; tinha apanhado de raspão a cadela, a Ligeira, raça de todos os diabos que o atacava pela orelha, e ficou aleijada para nunca mais; e ele então caíra sobre a esquerda, e trepara à fraga da Portela, e esperara o porco na clareira; e mal ele apontou, pumba! meteu-lhe três zagalotes no quadril.
– A gente a falar incomoda talvez el-rei – observou o barão de Bouro.
– Podem conversar à vontade, que não me incomodam.
– Aquilo é que é cabeça! – disse baixinho, tocado, um dos cónegos a outro cónego.
Generalizou-se a cavaqueira. Faziam-se brindes lacónicos, circunspectos, com um grande respeito, indicando-se el-rei por um simples gesto de olhos. – A virar! a virar! – Carminavam-se os cónegos. O Dom Prior de Guimarães sugeriu uma lembrança graciosa ao barão. Que havia dois padres Marcos, ambos priores de Guimarães. Mas o legitimo, o de São Gens de Calvos, dizia do outro:
– Forte bêbedo!
O visconde Nunes ria-se sarcasticamente; e enquanto os padres. num crescendo palavroso, explodiam sarcasmos ao outro padre Marcos, o secretário privado curvou-se sobre o ombro de el-rei e segredou-lhe:
– Carrega-lhe!
– Ora....
– Quanto?
– 2.
–3. Anda-me. 3.
–Será muito!...
– Bolas. 3, por minha conta. Coisa limpa. E, em voz alta e voltado para o grupo:
– El-rei pergunta se o Sr. Conde de Quadros tem família, se tem senhora e filhos. O Bezerra perguntou ao Zeferino.
Que soubesse Sua Majestade, disse o pedreiro, mais animado, que o fidalgo de Quadros tinha dois rapazes e três raparigas, uma já casada; mas que a fidalga, a mulher dele, aqui há anos atrás, tinha fugido com o doutor dos Pombais, e nunca mais voltara.
– Desgraças! – disse o capelão-mor – desgraças! A corrupção dos tempos. Se se não acudir quanto antes a isto, não sei que volta se lhe há-de dar.
Fez-se um silêncio condolente. Todos sentiam o caso infausto.
O rei continuava a escrever, devagar, polindo a frase, boleando os períodos; achava dificuldades em se medir com as locuções redondas e muito adjectivadas da retórica do padre Rocha. Animava-o, porém, a ideia de que
D. Miguel não tinha fama de sábio, e que a sua carta seria mais verosímil com alguns aleijões gramaticais.
Releu a carta, e acrescentou às vírgulas. Pediu obreia ao Munes. Acudiu o padre com uma quadrada, de certa grandeza, vermelha, cuidadosamente recortada.
O envelope ainda não tinha subido até Lanhoso. Sua Majestade dobrou em quatro a folha do almaço e sobrescritou – Ao conde de Quadros, general do exército real.
Nesta ocasião, o Cristóvão Bezerra chamou de parte o Nunes, falou-lhe em segredo, e terminou em voz alta: for do agrado de Sua Majestade.
– Eu vou falar a el-rei – disse Nunes com satisfatória condescendência.
Acercou-se do outro, com os braços pendentes, os pés juntos, um pouco inclinado, e falou-lhe baixo.
– Sim – respondeu o monarca.
– Está servido, Senhor Barão – comunicou o secretário, e foi registar no livro das mercês, proferindo em voz alta: Sua Majestade há por bem nomear sargento-mor das Lamelas Zeferino Ferreira, em atenção aos serviços de seu pai, o coronel Gaspar Ferreira.
– Vá agradecer a el-rei, Sr. Sargento-Mor – disse o barão de Bouro ao pedreiro. Zeferino foi ajoelhar, querendo beijar as botas ao homem.
– Levante-se, amigo – disse o príncipe. – Aqui tem a resposta da carta do meu amigo Cerveira Lobo. É necessário que ninguém veja este sobrescrito. Tome sentido, que ninguém saiba a quem esta carta é dirigida. Vá com Deus, e estimarei vê-lo aqui, Sr. Sargento-Mor, com outra carta do meu honrado amigo, enquanto não posso abraçá-lo pessoalmente. Adeus
A corte saiu em recuanços, dando-se mútuos encontrões para não voltarem as costas à majestade.
A criada apareceu então esfandegada para pôr a mesa, que estava a ceia pronta, e que o frango com arroz não esperava – que era preciso comê-lo logo que estava feito. Ficou para cear o Nunes. Ceava sempre com el-rei e com o abade.
O Zeferino, que tinha ali a égua e conhecia o caminho, não quis ir pernoitar a Santa Marta de Bouro. Havia luar e saía um rancho de romeiros para o Bom Jesus do Monte. Partiu em direcção a Braga, e ao outro dia de tarde apeava no sonoro pátio da casa de Quadros, por onde entrara com a égua em grande estropeada, com a cara escandecida numa congestão de júbilo.
O Cerveira estava a dormir a sesta.
– Apanhou-a hoje daquela casta! Como um cacho! – informou um caseiro.– Mandou aparelhar a poldra castanha do Sr. Egas, com os coldres das pistolas, escanchou-se na sela, com a espada desembainhada e desatou a galope por debaixo das ramadas a dar gritos: Eu estava a ver quando o levava a breca de encontro a um esteio de pedra, que malhava abaixo da burra como um dez!... Depois o Sr. Egas e mais o Sr. Heitor lá o apearam como puderam, e foram-no pôr a dormir. Arre diabo! lá que um homem uma vez por outra apanhe um pilão, vá; mas embebedar-se todos os dias, é muito feio! E depois ninguém se entende com ele. Medra com o suor dos pobres. Um fona. Que vá para o diabo que o carregue. Tanto se me dá como se me deu. Se me mandar embora, boas noites. Não é capaz de perdoar um alqueire de milho a um caseiro! Tem vinte mil cruzados de renda, não gasta nem cinco, andam os filhos a vender o mato e os pinheiros, uma vergonha, porque ele, a dois homens gastadores, que têm amigas, uma a cada canto, dá cada mês vinte pintos para os dois! O homem deve ter muita soma de peças enterradas! Qualquer dia cai-lhe aí em casa o José Pequeno da Lixa que lhe põe a faca ao peito até ele pôr ali o dinheiro à vista. Diz que quer comprar mais terras, e aqui há dias ofereceu seis contos pela quinta do Lopes de Requião. Veja você. Tem seis contos ao canto da gaveta, e ainda não deu cinco réis, que são cinco réis, à filha, à D. Teresinha, que casou com o estudante das Quintãs. Anda por lá de socas, sem meias, a fazer o serviço da cozinha. E estão aí as outras duas, que parecem umas fadistas, nas romarias, e, quando Deus quer, topa a gente de noite por esses quinchosos esses marotos dos engenheiros e empreiteiros a saltarem paredes para se irem meter com elas na casa do palheiro. Uma vergonha, mestre Zeferino, a vergonha das vergonhas! Eu sou um pobre; mas raios me parta, que se eu tivesse assim umas filhas... Olhe... (batia com o pé em cheio na relva) esmagava-as como quem esborracha uma toupeira. Deus nos livre de bêbedos! Deus nos livre de bêbedos! Você bem sabe o que isso é, mestre Zeferino, que pelos modos lá por casa não tem pouco que aturar a seu pai, que também as agarra muito profeitas! Olhe você como ele se tolheu quando foi, dia de Natal, dar fogo aos de Santo Tirso! Aquilo só com meio almude no bucho!
– Não é tanto assim atalhou o sargento-mor de Lamelas.– Não lhe digo que meu pai não tivesse algum graeiro na asa; mas o que ele fez não era você capaz de o fazer, tio Manuel.
– Ah! isso não, bem o pode dizer, mestre Zeferino. Nunca me emborrachei, aqui onde me vê com cinquenta anos já feitos; mas, se algum dia me emborrachar, que ninguém está livre disso, prego-me a dormir e não vou atirar- me ao Ave em Dezembro; àgora vou, se Deus quiser. Vai-se pôr o alma do Diabo a dar vivas ao D. Miguel! Qual Migue! nem qual carapuça! Se D. Miguel cá vier há-de fazer tanto caso de seu pai como eu daquela bosta que ali está. O que ele devia era tratar de conservar os terrões, e fazer como você, que se pôs a trabalhar e se fez pedreiro quando viu que os malhados lhe tomaram conta das terras. E daí? Você hoje tem o seu par de mel cruzados, ganhados com o suor do seu rosto, e até já me disseram que você dava quinze centos ao de Prazins para lhe casar com a rapariga. É assim ou não é?
– Isso acabou – respondeu com desdém, irritado. Agora não a queria nem que ele a dotasse com três contos; entenda você o que lhe eu digo, tio Manuel, nem com seis contos! Você não sabe quem eu sou, mas brevemente o saberá. Pouco há-de viver quem o não vir.
– Não sei quem você é? Ora essa... Já lhe disse que você é homem capazório, honrado...
– Quero cá dizer outra coisa... Você não entende... – E ouvindo abrir uma janela: – Lá está o fidalgo...
Deixe-me lá ir.
E. afastando-se do caseiro, ia dizendo consigo:
– Que tal está o labroste! Um homem vem de falar com el-rei, e topa com uma cavalgadura destas! Canalha ordinária!

Contos do Sábado na Usina: Artur Azevedo:


 

O CONTRABANDO

A Valentim Magalhães VI 

À uma hora, Geraldo apeava-se do carro e batia à porta de casa. Veio abrir-lha o José, que esperava a pé firme, e notou, surpreso, que o patrão viera acompanhado por uma mulher. A princípio supôs fosse a menina, que tivesse ido com o pai ao teatro e uma circunstância qualquer impedisse de voltar para o colégio, - mas qual não foi o seu espanto ao ver que se tratava de um contrabando, o primeiro que entrava naquela casa! 
— Pode recolher-se, disse Geraldo. 
O criado sumiu-se, e o patrão abriu a porta da sala, convidando Laura a entrar. Entraram, e ele imediatamente acendeu o gás. 
A rapariga olhou com curiosidade em volta de si e o retrato de Margarida chamou-lhe logo a atenção. 
— Que moça tão bonita e simpática! exclamou. Parece uma santa! — Quem é? 
— Minha filha. 
— Sua filha? Que idade tem? 
— Dezessete anos. 
— Tem a minha idade. 
Geraldo estremeceu. 
— Tem também dezessete anos? 
— Nasci em 1874. 
— Sim... e em que mês? 
— Em abril... no dia 27 de abril. 
O viúvo empalideceu e ficou a olhar para a rapariga com uma expressão singular. Depois sorriu, pareceu refletir, foi ao seu quarto, abriu um guarda roupa, e tirou do gavetão uma camisa de mulher que ali estava religiosamente guardada havia dez anos. com outras roupas que eram o espólio sagrado da morta. 
— Aqui tem uma camisa de dormir. Dispa-se e deite-se. 
Laura ficou sozinha no quarto. Ele esperou que ela se despisse e se deitasse, trouxe para a sala as suas roupas úmidas e estendeu-as nas cadeiras para secarem, apanhando o ar que entrava timidamente pelas venezianas. 
Tornou à alcova. Laura estava deitada. Tinha vestido a camisa. Bocejava. Parecia morta de sono. 
Geraldo cobriu-a com um lençol, e perguntou-lhe: 
— Gosta de dormir com luz? 
— Gosto. 
Ele acendeu uma lamparina e apagou o gás. Depois, aproximou-se da cama, abaixou-se, beijou a sua hóspede na fronte, e disse-lhe: 
— Boa noite, Laura; durma bem. 
— Oh!... então o senhor não se deita comigo?... 
— Não. 
— Por que? 
— Porque você nasceu no mesmo dia em que nasceu minha filha. Ela compreendeu, ficou muito triste e murmurou: 
— Boa noite. 
Geraldo foi para a sala, despiu-se e deitou-se no canapé. Refletiu que Laura iria talvez fazer mau juízo de sua virilidade, e espalhar por aí que ele não era um homem. Um instante quis erguer-se para justificar-se positivamente... Mas não; separava-os aquela data: 27 de abril de 1874; seria quase um incesto! Adormeceu e passou toda a noite no canapé. 
Levantou-se pela manhã, foi à alcova, e encontrou Laura acordada. Indicou-lhe a toilette num quarto adjacente, e levou-lhe as roupas que ficaram na sala a secar. Depois, serviu-lhe uma xícara de café com leite e biscoitos. 
Às oito horas e meia, Laura estava vestida. Geraldo chamou o José e deu-lhe ordem para acompanhá-la até a sua casa. Quando ela ia sair, ele meteu-lhe nas mãos um envelope contendo uma nota de cem mil réis, beijou-a na fronte, e disse-lhe: 
— Adeus, minha filha. 
E pôs-se à janela, e acompanhou-a com a vista até vê-la dobrar a esquina, com muita pena de não poder tirá-la para sempre daquela vida. 
Depois, foi contemplar o retrato de Margarida.

Contos do Sábado na Usina: Humberto de Campos:

 




Humberto de Campos 

LADRÃO!... 

A sala do júri da cidade provinciana enchera- se, desde o amanhecer, da melhor gente, não só do lugar, do perímetro urbano, como de todo o município e, ainda, dos municípios vizinhos. O processo que naquele dia se ia julgar, era, talvez, o mais sensacional formado na comarca. 
Tratava-se, na opinião geral, de um desses casos de degradação pela miséria ou pelo vício, da queda inesperada de um rapaz ainda novo, e dos mais considerados na sociedade local, da revelação, em suma, de um caráter baixo e depravado, que se disfarçara, até então, sob a roupagem do brio, da honra e das boas maneiras. 
Amplo e simples, o salão do tribunal era uma grande peça com doze janelas, na ala direita do andar térreo e único da Câmara Municipal. Sobre um estrado, a mesa pesada e tradicional, para o juiz e os auxiliares. Em frente ao magistrado, o tosco banco dos réus. Ao lado, separado por uma grade convencional, os membros do conselho de sentença. Do lado oposto, a tribuna, pequeno púlpito de roça. E atrás, como no recinto de um cinema, os bancos para os espectadores, nos quais a multidão se comprimia, abanando -se com os leques, com os lenços, com os chapéus. Pintadas recentemente, as paredes eram brancas, de cal. Nestas, uma nódoa única, e essa mesma, sagrada: a imagem do Crucificado, a cabeça pendente, os braços abertos e flácidos ao peso do corpo, como num conforto triste aos que fossem, como ele, vitimas da justiça dos homens. 
Embrulhado na sua toga, o juiz apareceu, cercado pelo silêncio geral. Era um homem alto, seco, de tez tostada, bigode curto e grisalho. Houve um movimento de cadeiras. A campainha soou, como nos atos litúrgicos. E a uma ordem do magistrado, entrou o réu, entre dois soldados. 
Abelardo Padilha Porto era acadêmico de medicina no Rio quando, com a morte do pai, teve de interromper os estudos e regressar precipitadamente à sua cidade natal. Os negócios do velho agricultor não tinham corrido bem, nos últimos tempos. Endividado, os credores, logo após a morte do devedor, haviam -se apossado da fazenda, da casa, do gado, das plantações. E se ele, e a velha mãe, ainda viviam na propriedade, era apenas enquanto esta não era vendida, para rateio judiciário do produto. Era esta a sua situação de pobreza, e de vergonha iminente, quando se deu o crime, que espantara a cidade. 
Entre os estabelecimentos mais movimentados da rua do Sal, estava o do português Antônio Rocha, constituído por uma casa de secos e molhados, cujo comércio diário subia a várias centenas de mil réis. A casa de negócio do gordo comerciante era, como em geral sucede no interior, o desdobramento, apenas, da sua casa de moradia. Com quatro portas de frente, três pertenciam ao armazém, e uma, apenas, à família, instalada nos fundos do prédio. A entrada para a casa de residência era, assim, independente; e feita por um corredor, comunicando-se, embora, a sala de jantar com o armazém, para o trânsito dos moradores. 
Era aí, segregada do mundo, sem uma janela por onde olhasse a rua, que vivia, há dois anos, uma das moças mais bonitas da modesta cidade provinciana. Casada por necessidade, escondera no seu coração, ao entregar- se para sempre ao homem que era o seu marido, uma afeição que lhe nascera na infância, e que sabia correspondida. Por vários anos relutara, na esperança de uma longínqua felicidade. E quando não pudera mais, quando a velha mãe, já tuberculosa, lhe anunciou que não duraria muito na terra, foi que resolveu aceder ao pedido de casamento do vendeiro português, entregando-lhe o seu corpo e o seu destino sem, contudo, entregar-lhe a sua alma. 
A chegada de Abelardo Padilha ao município, para liquidar os negócios paternos, havia abalado, fundo, o coração de Santinha Rocha. Amava-o como nos tempos de menina, e, se a sua virtude, a sua condição de mulher honesta, lhe não permitiam mais a realização de um sonho que alimentara desde criança, restava- lhe, pelo menos, o consolo de dar-lhe, na situação que atravessava, uma demonstração concreta, e pura, da sua amizade de irmã. Possuía economias, feitas pouco a pouco, possuía jóias, que o marido lhe havia dado; e tudo aquilo seria dele, do homem a quem amara sempre, daquele que fora, na vida, a única esperança do seu destino irremediável. E se ela possuía meios, recursos sem aplicação, por que não o socorria, evitando-lhe uma vergonha, e, com a vergonha, a miséria, a fome, e, quem sabe? o suicídio aos olhos da pobre mãe entrevada? Urgia, pois, chamá-lo, falar com ele, socorrê-lo. Procurá-lo, não ser ia possível, pois que o marido não a deixava sair desacompanhada. O remédio, era, portanto, fazê-lo vir à sua casa, sem testemunhas, na noite em que Antônio estivesse ausente. 
O processo era perigoso, mas era o único. Ademais, onde a estrada escura e coberta de espinhos que o Amor não ilumine e recubra de flores? E foi instado, solicitado, insistido, por dois, cinco, dez bilhetes de coração, que o Abelardo aquiescera em penetrar, naquela noite triste, na casa do comerciante. 
Antônio da Rocha havia saído, já há meia hora, em visita a um amigo, quando o vulto do antigo estudante surgiu à esquina, à claridade medrosa do pequeno lampião solitário. Parou, olhou em torno, examinando a rua. Não havia ninguém. Cauteloso, mergulhou de novo na sombra, e caminhava cosido com a parede, quando, em frente, exatamente, à porta do Antônio da Rocha, ouviu o seu nome, num sussurro, que o fizera estremecer: 
- Abelardo... Entra!... 
E logo duas mãos esguias, geladas, que apertavam as suas no escuro, e que, posta a porta no trinco, pois que o marido havia levado a chave, o conduziam, amigas, para a sala de jantar. 
Pondo o coração nas palavras, a moça contou-lhe, nervosa, os olhos cheios dágua, o motivo daquela temeridade. Que ele não fizesse mau juízo da sua virtude, da sua seriedade de mulher. Amava-o, sem dúvida; mas amava-o com saudade, não com esperança. Quem o havia chamado ali, não era a noiva, era a irmã, a companheira dos outros tempos. Queria-o de todo o coração. E não consentiria que ele, e principalmente sua mãe, tão idosa e tão santa, passassem pela vergonha de serem postos na rua, sem um abrigo ou um pedaço de pão. 
- Não é uma esmola que te dou, Abelardo; é um empréstimo que te faço! - disse, estendendo-lhe um maço de cédulas, que o rapaz, com a vergonha no rosto, recusava aceitar. 
Nesse momento, porém, a porta estalou na fechadura. 
- Meu Deus!... O Antônio!... - gemeu a moça, com olhos de terror. 
E como alucinada, empurrando o rapaz pela porta que dava para o armazém: 
- Foge!... Foge!... Pelo amor de Deus!... 
E enfiando-lhe o dinheiro no bolso do casaco, às pressas: - Toma!... Foge!... 
Pesado e mole, com a atenção emaranhada nas cifras, o vendeiro levou, ainda, alguns minutos para limpar os pés no capacho, trancar a porta, experimentar os ferrolhos; e minutos tão longos que, quando chegou à sala de jantar, a mulher já estava no quarto de dormir, simulando o primeiro sono.
Antônio da Rocha fora criado, porém, com espírito de prudência e sentido de previsão. Três vezes por semana, antes de deitar-se, tomava de uma vela e percorria, examinando meticulosamente os menores recantos, os dois compartimentos do armazém. E naquela noite, mandava-lhe a consciência, mecanicamente, que cumprisse aquela obrigação. 
A vela na mão esquerda, a direita no bolso da calça, o comerciante caminhava, despreocupado, entre pilhas de charque e sacos de arroz, quando ouviu, de súbito, um rumor de papéis remexidos. Estacou desconfiado e, depois de prestar melhor ouvido ao barulho, regressou ao quarto de dormir, apanhando o revólver e dizendo, para a mulher: 
- Temos ladrão em casa... Vem cá! 
- Antônio!... - exclamou a moça, sentando-se repentinamente na cama, as mãos na cabeça. 
Tomando aquela exclamação como um grito de medo, Antônio da Rocha marchou, resoluto, para o armazém. E, à porta do compartimento das vendas, gritou: 
- Quem está aí? E outra vez: 
- Se não responder, eu atiro! 
E esse tempo, o comerciante, que apagara a vela, havia já alcançado o comutador da eletricidade. E quando uma onda de claridade se espalhou pela casa, iluminando tudo, Antônio da Rocha estacou, estarrecido: diante dele, encostado a uma das prateleiras, estava o "doutor" Abelardo Padilha, corretamente vestido, a fisionomia serena, tendo nas mãos, amontoadas em pilhas, várias mercadorias apanhadas apressadamente no escuro: latas de leite condensado, vidros de conserva, maços de fósforos, um queijo, um pequeno embrulho de café. 
- O senhor... um ladrão!... - exclamou o vendeiro, a boca torcida, em uma ironia que era, ao mesmo tempo, de raiva e prazer. 
A essas palavras, Abelardo Padilha estremeceu. Uma onda de sangue inundou-lhe o rosto, cegando-o. Teve ímpetos de atirar tudo aquilo para o lado, e estrangular o miserável que assim o insultava. Lembrou-se, porém, de Santinha, da sua reputação, do seu destino, do dever, que lhe cabia, de salvá-la, dando a sua honra de homem pela sua honra de mulher. E, baixando a cabeça, deixou cair, tudo aquilo, com estrondo, no chão. 
E ali estava, agora, diante da cidade toda, para ser julgado. 
- O acusado - indagou o juiz, a voz pausada e serena, - o acusado confessa que penetrou, altas horas da noite, em um estabelecimento comercial, cujas portas se achavam fechadas... 
Que motivo o levou ali? 
- O roubo, sr. juiz! - declarou Padilha, a voz trêmula. 
E mergulhando a cabeça entre os braços desatou a chorar...

Contos do Sábado na Usina: Artur azevedo:


 

A Valentim Magalhães V

Quando a vitória de Tavares se pôs em movimento, conduzindo Laura e Geraldo, este bafejado pelo ar fresco da noite, foi pouco a pouco recuperando a consciência nítida dos seus atos, e medindo toda a extensão dos excessos a que se entregara.
Sinceramente arrependido de ter aceitado o convite do Tavares, comparecendo a um jantar que degenerara em orgia, achava agora um incômodo trambolho a infeliz rapariga que ali ia atirada no fundo daquele carro, com as pálpebras cerradas, ignobilmente vendida à concupiscência. 
Perdera de súbito aquele desejo que à mesa lhe despertara os sentidos; achava-se paternal junto dessa mulher, e velho demais para ela, que era quase uma criança. 
E lembrava das histórias que Laura lhe contara durante o jantar: o seu casamento, a sua fuga, a sua desgraça; e o coração enchia-se de piedade e azedume. Tudo aquilo devia ser verdade; ela não tinha ainda o feitio da cocotte, era ainda noviça na profissão: não devia saber mentir. 
E Geraldo perguntava aos seus botões: 
— Que vou eu agora fazer desta pequena?... 
Depois, lembrou-se da última vez em que andara de carro. Havia já alguns meses. Foi uma noite em que levara a filha aos Huguenotes e teve que restitui-la ao colégio depois do espetáculo. Como ameaçava chover, tomaram um carro no largo da Carioca. Margarida ia assim, como Laura, atirada para o fundo do carro, com as pálpebras cerradas... 
— Valha-me Deus! que vou eu agora fazer desta pequena?...