quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Poesia de Quinta na Usina: D'Araújo:

 




Fato

Com os olhos na janela
Vejo a vida a passar por ela
Com encanto ou desencanto não importa
O fato é que eu faço parte dela.

Vejo a vida enluarada
Vejo o lodo nas calçadas......

Poesia de Quinta na Usina: D'Araújo:

 




Diferenças

O ser difere-se um do outro não apenas pelas palavras
Mas sim pelos seus atos.
Os covardes se escondem por trás dos seus desejos....

Poesia de Quinta na Usina: Fernando Pessoa:

 




139.

"Há muito tempo que não escrevo. Têm passado meses sem que viva, e vou durando, entre o escritório e a fisiologia, numa estagnação íntima de pensar e de sentir. Isto, infelizmente, não repousa: no apodrecimento há fermentação."

Poesia de Quinta na Usina: Fernando Pessoa:

 




144.

"É domingo e não tenho que fazer. Nem sonhar me apetece, de tão bem que está o dia. Gozo-o com uma sinceridade de sentidos a que a inteligência se abandona. Passeio como um caixeiro liberto. Sinto-me velho, só para ter o prazer de me sentir rejuvenescer."

Poesia de Quinta na Usina: Fernando Pessoa:

 




148.

"O homem perfeito do pagão era a perfeição do homem que há; o homem perfeito do cristão a perfeição do homem que não há; o homem perfeito do budista a perfeição de não haver homem."
"Tudo quanto o homem expõe ou exprime é uma nota à margem de um texto apagado de todo. Mais ou menos, pelo sentido da nota, tiramos o sentido de que havia de ser o do texto; mas fica sempre uma dúvida, e os sentidos possíveis são muitos."

Poesia de Quinta na Usina: Machado de Assis:

 



MENINA E MOÇA

A Ernesto Cybrão
Está naquela idade inquieta e duvidosa,
Que não é dia claro e é já o alvorecer;
Entreaberto botão, entre-fechada rosa,

Um pouco de menina e um pouco de mulher.
Às vezes recatada, outras estouvadinha, 
Casa no mesmo gesto a loucura e o pudor; 
Tem coisas de criança e modos de mocinha, 
Estuda o catecismo e lê versos de amor.

Outras vezes valsando, e* seio lhe palpita,
De cansaço talvez, talvez de comoção.
Quando a boca vermelha os lábios abre e agita,
Não sei se pede um beijo ou faz uma oração.

Outras vezes beijando a boneca enfeitada,
Olha furtivamente o primo que sorri;
E se corre parece, à brisa enamorada,
Abrir asas de um anjo e tranças de uma huri.

Quando a sala atravessa, é raro que não lance
Os olhos para o espelho; e raro que ao deitar
Não leia, um quarto de hora, as folhas de um romance
Em que a dama conjugue o eterno verbo amar.

Tem na alcova em que dorme, e descansa de dia,
A cama da boneca ao pé do toucador;
Quando sonha, repete, em santa companhia,
Os livros do colégio e o nome de um doutor.

Alegra-se em ouvindo os compassos da orquestra;
E quando entra num baile, é já dama do tom;
Compensa-lhe a modista os enfados da mestra;
Tem respeito a Geslin, mas adora a Dazon.
Dos cuidados da vida o mais tristonho e acerbo


Poesia de Quinta na Usina: Machado de Assis:


NOIVADO

Vês, querida, o horizonte ardendo em chamas?
Além desses outeiros
Vai descambando o sol, e à terra envia

Os raios derradeiros;
A tarde, como noiva que enrubesce,

Traz no rosto um véu mole e transparente;
No fundo azul a estrela do poente
Já tímida aparece.

Como um bafo suavíssimo da noite,
Vem sussurrando o vento
As árvores agita e imprime às folhas
O beijo sonolento.

A flor ajeita o cálix: cedo espera
O orvalho, e entanto exala o doce aroma;
Do leito do oriente a noite assoma
Como uma sombra austera.

Vem tu, agora, ó filha de meus sonhos,
Vem, minha flor querida;

Vem contemplar o céu, página santa
Que amor a ler convida;
Da tua solidão rompe as cadeias;

Desce do teu sombrio e mudo asilo;
Encontrarás aqui o amor tranqüilo...
Que esperas? que receias?
Olha o templo de Deus, pomposo e grande;
Lá do horizonte oposto
A lua, como lâmpada, já surge

A alumiar teu rosto;
Os círios vão arder no altar sagrado,
Estrelinhas do céu que um anjo acende;

Olha como de bálsamos rescende
A c’roa do noivado.
Irão buscar-te em meio do caminho
As minhas esperanças;

E voltarão contigo, entrelaçadas
Nas tuas longas tranças;
No entanto eu preparei teu leito às* sombra
Do limoeiro em flor; colhi content

Folhas com que alastrei o solo ardente
De verde e mole alfombra.
Pelas ondas do tempo arrebatados,

Até à morte iremos,
Soltos ao longo do baixel da vida
Os esquecidos remos.
Calmos, entre o fragor da tempestade,

Gozaremos o bem que amor encerra;
Passaremos assim do sol da terra
Ao sol da eternidade.

Poesia de Quinta na Usina: Machado de Assis:


FLOR DA MOCIDADEii

Eu conheço a mais bela flor;
És tu, rosa da mocidade,
Nascida, aberta para o amor.


Eu conheço a mais bela flor.
Tem do céu a serena cor,
E o perfume da virgindade.
Eu conheço a mais bela flor,
És tu, rosa da mocidade.


Vive às vezes na solidão,
Coma * filha da brisa agreste.
Teme acaso indiscreta mão;
Vive às vezes na solidão.


Poupa a raiva do furacão
Suas folhas de azul celeste.
Vive às vezes na solidão,
Como filha da brisa agreste.

Colhe-se antes que venha o mal,
Colhe-se antes que chegue o inverno;
Que a flor morta já nada vale.
Colhe-se antes que venha o mal.

Quando a terra é mais jovial
Todo o bem nos parece eterno.
Colhe-se antes que venha o mal,
Colhe-se antes que chegue o inverno.