domingo, 25 de julho de 2021

D'Araújo: "INSÔNIAS"

 




O medo do depois

O brilho exposto em seu olhar deflagrava o intenso
desejo que lhe consumia.
Sua pele exalava um suave perfume de rosas, que
inebriava o ambiente, tornando tudo ali um
momento único......

Poema na integra no livro:
"INSÔNIAS"

Crônicas de Segunda na Usina: Auridan Dantas: CRÔNICA DO COTIDIANO – VUCO-VUCO NO “ISTOMBO”:


Aperreio só presta grande, mas é bom que você avise ao seu organismo que não é preciso exagerar. Já passei muito aperreio na vida, mas tem dois momentos que ficaram marcados na mente e nas casas em que estive. 
Namorando com Ana Flávia há apenas dois meses, fui veranear com a família dela na praia de Pitangui. Casa antiga, pequena, sem ser estucada, e daquelas em que o banheiro fica situado bem no meio da casa, exatamente entre a sala e a cozinha. E o pior, a parede do banheiro não vai até as telhas, pois é meia-parede. 
Sendo assim, e devido a um vu-vu-vu repentino no “istombo”, consegui esperar todo mundo descer para a praia, e fiz carreira para o tão sonhado vaso sanitário. Relaxei e fiz o “caneco” virar artista: uma obra gótica, e com forte odor. 
De repente, escuto uma voz vinda da cozinha: que dia- cho é isto? Mataram um urubu aqui dentro? Era a tia de Ana Flávia, que tinha ficado terminando o almoço, e na hora que fui ao banheiro, ela tinha ido à despensa. 
Fiquei pensando: e agora? Quando sair ela vai me ver e saber que eu sou o tal do urubu. Não adiantou, pois mesmo eu saindo sem ela me ver, ficou fácil saber quem era o autor da obra, pois só faltava eu lá na praia. Fiquei marcado na fa- mília dela como o cheiro podre de Pitangui. 
Mas não ficou só nessa não. Fui ao aniversário de um amigo na casa de praia em Búzios, e bem no meio da festa lá veio outro vu-vu-vu. Um sol da peste e eu me arrepiando. A cerveja descia parecendo um rodo – jogava tudo lá pra baixo. 
Perdi a vergonha e pedi para o dono da casa me in- dicar um local tranquilo. Não tinha. O mais perto era bem no meio da sala. E nesta peste de sala tinha três crianças assis- tindo televisão. Logo pensei: do jeito que criança é sincera, eu estou lascado se repetir a proeza de Pitangui. 
Escapei fedendo... Aliás, cheiroso.

Crônicas de Segunda na Usina: Auridan Dantas: CRÔNICA DO COTIDIANO – AMIGOS, AMIGOS – GASES A PARTE:



Atualmente, cada situação que vivencio, já fico pensando no que vou escrever de forma cômica. Ao assistir uma palestra sobre a produção de gás natural no Brasil, e sua consequente distribuição e importância para a sociedade, já peguei o bloco de anotações e caneta entregues na entrada e fui escrevendo as minhas besteiras.
Tendo em vista que o gás natural é a porção do pe- tróleo que existe na fase gasosa, e que dentre os seus compo- nentes consta Oxigênio, Gás Carbônico e Enxofre, foi inevitável não associar estas informações aos gases produzidos pelo ser humano – os populares peidos. 
Considerando o que foi dito sobre a produção de gás e a riqueza que traz para as regiões que o produzem, fiquei pensando o quanto alguns colegas meus poderiam estar ricos, pois produzem gases em escala industrial. Esses colegas são “verdadeiros latifundiários” de gás sulfídrico, que contém enxo- fre e é responsável pela grande diferença com o gás natural – o cheiro (a catinga). A dieta dessas peças impolutas é constituída por pratos com couve-flor, ovos e carne, que são especiarias notórias por produzirem peidos malcheirosos. 
O gás natural não precisa explodir e nem fazer barulho na sua produção. Já o peido tem um som que depende da velocidade da expulsão do gás e da “embocadura do caneco”. 
Esses colegas ultrapassam todas as estatísticas de produção. Em média, uma pessoa normal produz mais ou me- nos um litro de peido por dia, distribuído em cerca de 14 pei- dos diários. Esses caras não. A produção é o triplo disso, e o barulho se assemelha a um terremoto. 
A esposa de um deles já possui uma máscara respi- ratória natural, e às vezes nós pensamos que está com icterí- cia, de tão amarela que ela fica – também, aguentando essa pisada há mais de 20 anos – é uma sobrevivente. Até poderia descontar a sacanagem, pois as mulheres peidam tanto quanto homens. O caso é que os homens têm mais orgulho disso. De manhã, então. Sequer diz bom dia, já libera um trovão matinal, com ressonância amplificada. 
Mas, são produtores de energia limpa, apesar de mal- cheirosa, e poderiam estar estimulando a economia do nosso estado. Muito ricos, certamente, já poderiam ser. Só não sei quem teria coragem de envasar essa produção deles...

Crônicas de Segunda na Usina: Auridan Dantas: CRÔNICA DO COTIDIANO – O CARRO QUE EU LEVAVA PARA PASSEAR:



Na terra do sol, das praias e das dunas é muito bom andar de buggy. Tem muita gente que possui buggy e usufrui bastante. 
Acho que a única pessoa que o buggy não o levava para passear, e sim, ele é que levava o buggy para passear, era eu. Não fui o dono do buggy. Ele é que foi meu superior. 
Mesmo assim, tentei deixá-lo de primeira. Tinha até cinto de segurança. Mas faltava pneu de step, buzina e outros apetrechos. 
O danado do buggy tinha vontade. Só andava quando queria. Fincava pé, que nem jumento em beira de estrada. Eu nunca sabia se ele queria andar comigo. Era de veneta. Tinha dia que nem no empurrão ele queria pegar. 
Para se ter uma ideia da “prejura”, quando eu ia deixar minha filha na escola, ela pedia para eu não parar na frente da escola (tinha vergonha dele estancar e ter que empurrar o bicho). 
Não tinha marcador de nada. O nível da gasolina era verificado com um pedaço de cabo de vassoura. Os faróis esta- vam sempre brigados. Nunca vi os dois acesos de uma só vez. 
Sinaleira? Nem pensar. Se eu não acenasse com o bra- ço que ia entrar para um dos lados, tinha levado muita porrada. 
Teve uma vez que um mecânico foi mexer no motor do sacana do buggy, e depois de um tempo catucando, olhou pra mim e disse: você ainda tem coragem de gastar dinheiro nesse projeto de carro? 
Vendi no mesmo dia. Consegui achar outro abestalhado.

Crônicas de Segunda na Usina: Auridan Dantas: CRÔNICA DO COTIDIANO – MEU VELHO FUSCA:


Eita, fusca velho de guerra. É um carro pra toda obra. Quem nunca teve um, pelo menos tem um parente ou amigo que teve ou tem. 
O meu primeiro carro foi um fusca, e era possante: de bom, tinha o motor 1.600, volante esportivo e pneus largos. O resto? Era o resto (literalmente). Começando pela cor: amarelo queimado. Certamente, na hora de comprar, fui enrolado no que se refere à cor. Tinha ferrugem para todo lado. Em dia de chuva, era melhor ficar do lado de fora do que andar nele. 
Dei carona a um amigo, após a pelada de futsal do sábado à tarde que tinha no Campus Universitário, e estava chovendo. Na primeira poça d’água, tomamos uma “xiringada” de água bem no meio dos peitos. Qualquer coisa solta no piso do carro ficava boiando. 
Quando saía com Ana Flávia nesse carro, era um problema – ela toda arrumada, perfumada, mas bastava eu dar uma acelerada, que “empestava” o carro com o cheiro de gasolina. Se ela não andasse com perfume na bolsa, ficava fedendo a noite toda. 
Depois de um conserto no eixo deste possante por um mecânico embriagado numa manhã de sábado, o bicho fica- va fazendo a curva só para um lado. Para o lado direito, ele girava tudo, e para o lado esquerdo, não girava quase nada. Para fazer a curva para esse lado, era um vai e vem da pes- te. E esse serviço foi feito justamente quando eu ia participar do primeiro veraneio com a família de Ana Flávia. Pense numa vergonha. Logo na saída, arranhei o carro nos pilotis do prédio da tia dela, pois não tinha como sair, fazendo a curva só para um lado. 
Tinha uma folga tão miserável no volante, que quando alguém estava de carona e eu fazia uma movimentação exage- rada no volante (só de sacanagem), o carona dizia: ei, né nessa rua que é para entrar não. E eu dizia que não estava fazendo 
a curva não, estava só “aprumando” o volante. A pessoa só faltava fechar os olhos, de tanto medo. 
Outra vez, estacionei na porta de um restaurante, pois era uma comemoração da turma de Odontologia. Na saída, na frente de todo mundo, o sacana não pegou, e juntou uma turma arrumada para empurrar – vergonha total. 
Depois de tanto aperreio, resolvi vender. Ocorre que, depois do anúncio de venda, eu viajei. E meu pai ficou com uma missão inusitada: se o comprador quisesse testar o carro, tinha que dizer a ele para andar devagar e só de um lado da rua (o lado que não tinha buracos), pois a bateria ficava apoiada numa pedaço de madeira, porque a ferrugem já tinha corroído o piso do carro (no fusca, a bateria ficava debaixo do banco do passageiro). 
Perdi o velho companheiro de viagens e de biritas, mas muita gente agradeceu e vibrou após a venda. 
Mas um fusca será sempre um grande companheiro.


Crônicas de Segunda na Usina: Auridan Dantas: CRÔNICA DO COTIDIANO – CEGUEIRA DAS CORES:



Sorte ou falta de sorte? Sei lá. 
Acromatopsia? Você sabe o que é? Popularmente é co- nhecida como a cegueira das cores. Cientificamente é um pro- blema de num sei que lá, num sei que lá, num sei que lá, bem invocado. E, didaticamente, é uma situação em que o sujeito não identifica determinadas cores, em especial as cores pardas. 
Esse troço só acomete 7% da população masculina mundial. E adivinhe que foi “premiado” com isso? O leso aqui. Um mundo tão grande, com tanta gente, e essa porcaria vir me achar aqui em Natal. 
E é por isso que faço parte da história da educação mundial, pois sou o único cidadão do mundo que repetiu o jardim de infância. Isso mesmo, repeti o jardim de infância. Fico pensando naquelas coleções de lápis coloridos em cima da mesa (que tem umas 200 cores), a professora me mandando usar a cor verde, e eu tateando todos os lápis, e pegando exa- tamente os que não eram verdes. Castigo na certa. 
Já mais crescido, devo ter usado algumas velhas táti- cas de sorteio: 
“je-sus- dis-se - que - eu -es-co-lhes-se - es- se - da-qui” (como se Jesus, com tantos pedidos importantes, fosse ficar escolhendo cores pra mim), ou. 
“pan – dê – co – lê – dá – pá – dé – pi – pê – rú – gê – pan – dê – pê” (esse é de lascar). 
Porém, só fui descobrir oficialmente essa dificuldade visual quando já estava na faculdade. Minha sorte foi que, quan- do criança, nunca escolhia roupas (antigamente era assim), no colégio havia farda e na faculdade andava de branco. 
Certamente foi motivo de muito fora de namorada. Elas pensavam – ô cara de mau gosto. Quando namorava com Ana Flávia, quase nunca saía nos finais de semana, e ela só veio me dizer, depois de casada, que era porque eu estava feito um papangú. Se fosse hoje, eu seria o Agostinho da Grande Família 
– era troncho mesmo. 
Certa vez, em um evento de RH, o colega de apar- tamento sabia dessa minha dificuldade com as cores, e que minhas roupas iam arrumadas na mala já com as “pareias” separadas, e resolveu fazer uma mistura, enquanto eu tomava banho. Quando saí do banho, ele já tinha saído para a soleni- dade de abertura. Então, troquei de roupa e me mandei. Já no corredor do hotel, notei que as pessoas me olhavam diferentes. No elevado foi pior, pois algumas pessoas ficaram rindo. Quan- do a porta do elevador abriu no saguão do hotel e o pessoal desceu, a colega do RN que tinha ido comigo não me deixou nem descer, e foi logo dizendo: volta, volta para o apartamen- to, e pela caridade troque de roupa, porque o negócio tá feio. Voltei. Mas, e daí? Ia fazer o quê? Estava tudo esculhambado e eu não sabia nem o que procurar. Então, peguei uma calça escura e uma camisa escura e pronto, tudo resolvido (pelo menos pra mim). 
Mas, hoje em dia ainda tem os sacaninhas que inven- taram tal de degrade. Achando pouco já ter o verde, agora tem o verde claro, verde escuro, verde oliva, verde mais ou menos, verde mato, e haja verde. Só me lasco. 
Se me convidar e não quiser que eu chegue à sua casa, é só não dizer o número e dizer a cor. Se não tiver co- piloto, num chego não. 
Falar em copiloto, eu dou o maior valor quando tem alguém no carro, porque de vez em quando é necessário opinar sobre a cor do sinal de trânsito. É cada susto invocado... 
Na maioria das vezes, vou na onda dos carros vizinhos. 
Se eles fizerem merda, eu vou junto, só para ser solidário...