AURORA
Antes de erguer-se de seu leito
de ouro,
O rei dos astros o Oriente inunda
De
sublime clarão;
Antes de as asas desprender no
espaço,
A tempestade agita-se e fustiga
O turbilhão
dos euros.
As torrentes de idéias que se
cruzam,
O pensamento eterno que se move
No
levante da vida,
São auras santas, arrebóis
esplêndidos,
Que precedem à vinda triunfante
De um sol
imorredouro.
O murmurar profundo,
enrouquecido,
Que do seio dos povos se levanta,
Anuncia a
tormenta;
Essa tormenta salutar e grande
Que o manto roçará, prenhe de
fogo,
Na face
das nações.
Preparai-vos, ó turbas!
Preparai-vos,
Rebatei vossos ferros e cadeias,
Algozes e
tiranos!
A hora se aproxima pouco a pouco,
E o dedo do Senhor já volve a
folha
Do livro
do destino!
Grande há de ser o drama, a ação
gigante,
Majestosa a lição! luzes e trevas
Lutarão
sobre os orbes!
O abismo soltará seus tredos
roncos,
E o frêmito dos mares agitados
Se unirá aos das turbas.
Os reis convulsarão nos tronos
frágeis,
Buscando embalde sustentar nas
frontes
As úmidas
coroas...
Debalde!... o vendaval na fúria
insana
Os levará com elas, envolvidos
Num
turbilhão de pó!
Vis, abatidos, o fidalgo e o rico
Sairão de seus paços vacilantes
Nos
podres alicerces...
E errantes sobre a terra irão
chorando,
Mendigar um farrapo ao vagabundo,
E um
pedaço de pão!
Estranho povo surgirá da sombra
Terrível e feroz cobrindo os
campos
De
cruentos horrores!
O palácio e a prisão irão por
terra,
E um segundo dilúvio, então de
sangue,
O mundo
lavará!
O sábio em seu retiro,
estupefato,
Verá tombar a imagem da ciência,
Fria
estátua de argila,
E um pálido clarão dirá que é
perto
O astro divinal que às turbas
míseras
Conduz a
redenção!
Como aos dias primeiros do
universo,
O globo se erguerá banhado em
luzes,
Reflexos
de Deus;
E a raça humana sob um céu mais
puro
Um hino insigne enviará,
prostrada
Aos pés
do Onipotente!
Irmãos todos serão; todos
felizes;
Iguais e belos, sem senhor nem
peias,
Nem
tiranos e ferros!
O amor os unirá num laço
estreito,
E o trânsito da vida uma romagem
Se
tornará celeste!
A hora se aproxima pouco a pouco;
O dedo do Senhor já volve a folha
Do livro
do destino!...
Ergue-se a tela do teatro imenso,
E o mistério infinito se desvenda
Do drama
do Calvário!
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