Noticiam
os jornais que um delegado inspecionando, durante uma noite destas, algumas
delegacias suburbanas, encontrou-as às moscas, comissários a dormir e soldados
a sonhar.
Dizem
mesmo que o delegado-inspetor surripiou objetos para pôr mais à mostra o
descaso dos seus subordinados.
Os
jornais, com aquele seu louvável bom senso de sempre, aproveitaram a
oportunidade para reforçar as suas reclamações contra a falta de policiamento
nos subúrbios.
Leio
sempre essas reclamações e pasmo. Moro nos subúrbios há muitos anos e tenho o
hábito de ir para a casa alta noite.
Uma
vez ou outra encontro um vigilante noturno, um policial e muito poucas vezes
é-me dado ler notícias de crimes nas ruas que atravesso.
A
impressão que tenho é de que a vida e a propriedade daquelas paragens estão
entregues aos bons sentimentos dos outros e que os pequenos furtos de galinhas
e coradouros não exigem um aparelho custoso de patrulhas e apitos.
Aquilo
lá vai muito bem, todos se entendem livremente e o Estado não precisa intervir
corretivamente para fazer respeitar a propriedade alheia.
Penso
mesmo que, se as coisas não se passassem assim, os vigilantes, obrigados a
mostrar serviço, procurariam meios e modos de efetuar detenções e os notívagos,
como eu, ou os pobres-diabos que lá procuram dormida, seriam incomodados, com
pouco proveito para a lei e para o Estado.
Os
policiais suburbanos têm toda a razão. Devem continuar a dormir. Eles, aos
poucos, graças ao calejamento do ofício, se convenceram de que a polícia é
inútil.
Ainda bem.
Vida
urbana, 28-12-1914
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