Os olhos têm
aquela expressão vazada de perversa inocência, de suprema condescendência, como
dos ídolos talhados em ouro e prata à luz das tochas, indiferentes às cerimônias e ao borbulhar das paixões
e sacrifícios humanos; a
macia pele do rosto de dezenove anos incompletos transparece
e crepita, mas
não se deixa tocar e, se o faz, o seu tato
é de borracha ou vinil,
porque os jovens
de dezenove anos incompletos são pequenas monstruosidades
portadoras do aleijão psíquico, faltando pedaços, como um
ombro para se chorar,
um olhar atento,
o gesto brusco no vácuo do antebraço consolador; os lábios congelados
na frase de Peter Pan "eu sou a juventude
eterna!", a mão perpetuamente brandindo a estocada final na passagem do
tempo. Um adolescente é sempre monstruoso porque desumano, assim
como um deus,
assim como um anjo, assim como você, Robi.
Eu o conheci
precisamente no dia que completava trinta anos,
dirigindo amargurada meu automóvel para o analista. Pensava: o Superman também
tem trinta anos - mas o fato é que ele não existe, eu sim, e muito
passageiramente,
pelo visto. Fisgava-me freqüentemente refletindo sobre a minha transitoriedade
e a imutabilidade da natureza. Esse mesmo céu, esse mesmo crepúsculo, essa
mesma intensidade de tons avermelhados e laranja que contemplei aos quinze anos
estão agora testemunhando meus trinta, inalterados, imperturbáveis, tão
odiosamente imutáveis, mas, se ter consciência
disso é o preço
da mortalidade, eu prefiro pagá-lo a permanecer nesse estado bestialício de
eternidade inanimada, como as areias, os corvos, o crepúsculo, as montanhas e o mais.
O que não deixa
de ser putamente injusto, prosseguia pensando, quando o ronco de uma
motocicleta ao lado do automóvel sobrepujou a música em FM, como também os
pensamentos acima descritos, além de
todo o resto, o
que acabou por irritar-me. Havia esquecido que deixara o vestido levantar,
exibindo as coxas, daí Robi, o motoqueiro, aparecer na minha janela, caninos
pingando sangue.
Por segundos,
foi como se estivesse me vendo lá fora, do
outro lado da juventude, há dez, doze anos atrás, o sorriso entre
tímido e malicioso, olhos irrequietos, inseguros, lábios naturalmente úmidos,
cabelos emaranhados e
elétricos como filamentos
de cobre molhado e, Deus meu, que beleza! Quando desviei o rosto tinha
envelhecido o suficiente a ponto de fixar os olhos embaçados nos ponteiros
luminosos mas, empurrando a dor para
baixo, sete
palmos no inconsciente, senti só irritação pela intromissão do rapazinho que perturbava meus pensamentos, minha
solidão, minha maturidade, espiando, sem mais nem menos,
para dentro do carro, com a mesma
sem-cerimônia que um bebê,
escondido debaixo da mesa, espiaria as calcinhas
das senhoras.
Devo acrescentar
que, dentro de um automóvel, sinto-me tão absolutamente só e segura como no
ventre materno e, além do mais, não havia
notado as coxas. A bem da verdade, fiz
tudo para livrar-me dele, mas o destino
conspirou:
Destino I:
Motoca seguiu-me até a vaga da zona azul e, após observar divertido cerca
de dezoito manobras
humilhantes e malsucedidas, ofereceu-se para estacionar o automóvel de madame.
Destino II:
Acertou na primeira (não que fosse muito bom,
ruim sou eu, especialmente se observada por crianças. Elas me põem
nervosa).
Destino III:
Obrigada / Você tem telefone? / Não me importa nem um
pouco deixar que
os homens fa... / Estou sem lápis / Mas quantos anos você tem? / Oitenta e cinco. Tem caneta? / Não saberia
exatamente o que fazer com você / (Risinho pilantra, procura pedaço de papel na carteira) / 62-3145. Tchau, tenho hora no médico / Médico? / No analista
/ Pra que o psiquiatra, garota? / Analista / ri. Analista / Demora pra
explicar / Eu telefono / Então
telefona / Meu nome é Robi / Wood? /O quê / O meu é Diana. Tchau.
O tempo fluiu
(como sempre). Passaram duas semanas. Não paro
em
casa, mas o garoto
tinha um faro diabólico. Sempre
me pegava nos intervalos
da muda de roupa, banho, jantar e outra escapada. Enquanto isso eu: a) estava sendo
perseguida por um cineasta maldito; b) batia cartas
comerciais;
c) fazia um
tratamento dentário intensivo; d) chateava-me com os amigos no bar; e) ou seja, merdava.
Certa tarde,
final de expediente no escritório, eis Robi que surge ao lado da minha escrivaninha: vamos sair? Caninos pingando
sangue. Sem saber como, ele vencera as estruturas de aço da burocracia e,
munido de crachás, credenciais de
apoio e um sorriso tentador, me apanhara debruçada sobre uma IBM, dois
diretores afoitos e quarenta e cinco atentos funcionários entrincheirados na
vastidão do expediente. Como se eu não tivesse coisa melhor a fazer no mundo
que sair com ele. E não tinha mesmo.
Para mim
a situação se
afiguraria esmagadora, mas Robi era um caçador
nato. De toda uma vasta multidão de
admiradores, ele se destacara surpreendendo-me na minha própria cidadela. Ele,
Robi, o motoqueiro. Era incrível.
Sente-se, sorri
divertida, já termino essa carta. Mas meus
dedos tremiam. Cruzar ou não as pernas? Dirigir-me como agora ao meu chefe? E
se etc
dirigir-se a mim?
Teria forças psicológicas para proceder aos processos
e pareceres? Entao era assim
que eu sobrevivia? Aquele garoto de jeans, blusão de couro e botas de montaria,
sentado displicentemente numa das poltronas da sala de espera, transformara-se
no meu inquisidor, meu juiz de alçada, meu anjo vermelho. Lúcifer, o decaído,
piscando de sua torre flamejante, reduzindo a cinzas e ao ridículo aquele santuário
simétrico da burocracia. E
não tinha
consciência disso. Tanto melhor. Consciência tenho eu, por isso as coisas dão
no que dão. Ficam tão malparadas.
A evidente
oposição do garoto ao ambiente produzia-se como um
fenômeno natural. Bastaria que ele (ou nós) acordássemos para que o encanto fosse desfeito. E as oposições são tão tentadoras, tão novela das oito, que eu já andava ansiando por uma paixão Lamacenta. Na verdade, estava me atirando dentro dela. Com maiô executivo e tudo. Saímos. No meu carro, porque a moto estava quebrada. A princípio eu o fitava como se estivesse observando um formigueiro: com curiosidade científica, ócio e nenhuma emoção. Puro divertimento. Dentes um tanto amarelados (feitos de doce de leite, desses com vaquinha no rótulo), olhos que jamais se fixavam no interlocutor, uma adição mal disfarçada pelo paradeiro que dar as mãos, o crânio ligeiramente achatado, mas ao contrário do achatamento produzido pelo fórceps, bebê Robi parecia ter sido retirado da mamãe com uma forminha de tostex, Deus me perdoe, mas era só um defeitinho à-toa; um belo nariz e um bom corte de cabelo, em camadas.
Como James Dean,
comparei mentalmente. Mas só mentalmente, não verbalizaria a comparação. Talvez
ele não conhecesse James Dean. Talvez achasse velha demais ao compara-Lo a
alguém antigo como Dean.
Imagina o que
pensaria se exumasse coisas como George Raft,
Johnny Weismüller, tango, Tarzã, bolero e Gilda!
Estávamos num bar. Eu bebia vodca com suco de laranja, ele coca-cola. o problema não era propriamente a bebida, mas sim a falta de grana, explicou. A gente acostuma a não beber e também não fumar, vive-se de hambúrgueres e chiclete, é isso. Classe média alta paulistana, Robi estudava bastante, o colégio era um bocado puxado, tinha papai, mamãe, uma governanta romena (babá, neném) e só pensava em duas coisas: garotas e moto. E isso quer dizer que não pensava. Devaneava. Flutuava. Flanava.
Fluía. Ele
simplesmente existia! A frase de Nelson Rodrigues "toda mulher devia amar
um menino de 17 anos" furou-me o ventre e atingiu em cheio o, digamos, coração.
Depois havia lido numa revista
feminina que o homem atinge sua potência máxima dos
13 aos 22 anos. Robi,
com 19, estava na faixa. Ótimo. O problema nessa idade é que se
pensa tanto em sexo que na hora de fazer quedamo-nos psicologicamente impotentes, em pânico. A realidade é tão besta comparada à fantasia, àquele
ser esplêndido que julgamos ser. Dos 13 aos 20 anos fazemos portanto muita ginástica.
Física e mental.
Mas nunca em sincronia, eis a questão. Nunca estamos onde devíamos estar, nunca estamos em parte alguma. A eterna dicotomia corpo e alma. E falando em dicotomia, a razão dos meus devaneios, no momento, fazia observações, aliás muito interessantes, sobre a sua (dele) conceituação de bem e mal. Para ele não existia. Porque, veja, garota, o que é legal para mim pode não ser pra você, tudo é relativo, aquele mendigo fodido ali na esquina pode estar muito mais numa boa que nós aqui bebendo, meu pai se acha muito certo quando dá esmolas ou vai à porcaria duma missa, mas o mendigo pega a grana e vai comprar cachaça e o padre vai gastar o dinheiro nas corridas de cavalo e todo mundo então fica muito feliz pensando estar certo, era só não pensar porra nenhuma ou até cometer um crime que ia ter um sujeito feliz, sei lá, vai que o cadáver tivesse inimigos ou você própria morresse de tesão por sangue, tudo é um jogo, garota, o cara dança se não souber jogar, quer dizer, dança como meu pai, puta babaca, ou o padre viciado ou o mendigo da esquina... Menos você, Robi, pensei, julgando-os todos. Arquivando-os, classificando-os para poder controlá-los, dominá-los, senão você se perde na floresta e começa a chorar de medo, neném. Fazendo voltar o filme do tempo, vi-me a mim própria dizendo aquelas mesmas coisas. Com aquele mesmo ar de rarefeito desprezo. Mas, o coração é um caçador solitário, sentenciei emocionada, Carson McCullers tinha razão, e Flanery O'Connor e todas essas irlandesas e irlandeses passionais, e até Faulkner, Scott Fitzgerald, inclusive você Robi, que nada sabe de nada, também com seu tacape envenenado. Estávamos na época do Natal. Natal de 1976, amaldiçoado Natal fodido, mais precisamente no dia 22 de dezembro, sexta-feira, o Robi tinha um problema: a irmãzinha de quatro anos, faltava comprar o presente dela. Ele descobrira que Gugui (Maria Augusta) lhe daria umas luvas bacanérrimas de moto, tinham custado uma grana, garotinha genial a Gugui, ele precisava retribuir, saca? Não sabia com quê.
Uma boneca, sugeri irrefletidamente. Ele fez cara de "não dá pra inventar um presente mais criativo?". Fosse então por isso, comecei a defender veementemente a idéia: porque uma boneca voltou a ser um presente criativo, porque é o sonho de toda garotinha, porque hoje em dia tem bonecas geniais, porque era um presente que a Gugui não esqueceria, porque eu ajudaria a escolher e porque e porque. E perguntei quanto ele tinha, porque, além de tudo, uma boneca custa uma nota preta. Robi espiou a carteira: uma quina e dois duques. Setecentos, somei e traduzi mentalmente, deve dar.
Mas a tal boneca
custou duas quinas que eu tive de ajudar a pagar. Enquanto ele pegava o
dinheiro, meio sem jeito, eu argumentava:
- Fica como um
presente meu para a Gugui. Sem ela saber, claro.
Papai Noel é invisível. E depois, até que eu gostaria de ter uma irmãzinha só pra dar um presente como esse...
Ele me olhou
como quem diz "não faz média. Paga e pronto". OK.
Robi, neném, vou
ser clara. Para falar a verdade não ligo
a mínima pra dinheiro, mas esta noite eu acho que tenho de suborná-lo. A você e
à sua juventude. Pensava tudo isso enquanto ele guiava sem destino (a boneca no banco de trás), perdidos no trânsito
pesado daquela cidade cheia de luzes,
vozes arranhando alto-falantes, sinos transistorizados de Belém, reflexos
dourados, homens-sanduíche, lixo, gritos de crianças ensandecidas pela Noite Feliz.
E agora? O olhar
dele desceu agudo, filhote de falcão da
campina, sobre minhas pernas cruzadas. Senti-me desconfortável. Sugeri comermos. Ele disse está bem e eu olhei
bem firme para frente. Não queria
ver aqueles olhos, não queria ver aquele rosto, não queria
ver aquela expressão especialmente
perversa, infantilmente perversa, não queria me sentir velha
demais, o outro lado do espelho desse
rosto cuja expressão também já fora minha,
e sabia que ele pressentia haver algo errado
comigo, essa minha pretensa segurança, pretensa maturidade, um vago movimento
de mendicância, e que, por exemplo, nem ao menos eu gostava de mim, senão não
prosseguiria por tempos imemoriais caçando aves implumes na orla do pântano. Se
não estivesse ferida, estaria voando.
Fomos a uma cantina italiana. Ou melhor, eu o levei a uma cantina italiana. Garçons amigos, contas penduradas etc. A luz avermelhada das velas incidindo sobre o xadrez vermelhinho das toalhas e lambendo-lhe o rosto, Robi ficava com uma expressão solene, de coroinha. Mas não era bem assim, principezinho do ritual de iniciação. Ajeitei-me na cadeira, pedi mais vinho, segurei sua mão debaixo da mesa (ele não admitia demonstrações em público), apalpei suas pernas musculosas debaixo do grosso índigo blue, pedi-lhe para afastar as coxas, mergulhei a mão com segurança, fechei os olhos e pensei: Meu Deus! Retirei a mão, voltei ao vinho. Robi continuava sério, olhando além da janela, além dos queijos, dos salames, dos presuntos que oscilavam sobre sua cabeça. Como quem acompanha o vôo de uma mosca, foi descendo a vista e perguntou o que está olhando? Eu disse nada / me deixa encabulado / por que? / fica me olhando assim / assim como? - mordi os lábios, não confessar nunca. Nada. Não quer mais vinho? Estendeu o copo, enchi, sorrimos. Não gostaria de ir para outro lugar? Os olhos negros baixos no prato foram levantando lentamente, emergindo da sombra com macia ironia, mas o foco não subiu além de meus lábios. Está bem. Apague a vela, neném.
Sensivelmente
alterada, informei-lhe que guiaria o automóvel. Não
disse nada. Sentou ao meu lado num silêncio noturno de animal confiante. As ruas que percorremos estão na minha lembrança como um longo corredor recheado de espessa nebulosa cinza-chumbo varrida por um vento escuro. De esquina em esquina, clarões e colares de luzes assaltavam a mente enevoada, mas, nem por isso, desviei-me do trajeto impresso em meu cérebro como uma fita gravada, alheia ao álcool, aos meus impulsos, à minha dor. Bati a porta do carro. Robi, do outro lado, hesitava, olhando o pacote, retângulo negro de estrelinhas prateadas sobre o banco traseiro. É só uma boneca, ninguém vai roubar, ela tem destinatário. Encarou-me magoado -
É só uma boneca?
- mas eu já não estava pensando mais nisso.
O quarto tinha um espelho redondo sobre a cama, e foi nele que eu e Robi nos vimos pela primeira vez. Aparentemente não havia nenhuma diferença: uma mulher de estatura média, cabelos castanhos sobre os ombros, rosto oval e pálido. Um homem, também de estatura mediana, cabelos etc. Nada. Nenhum indício do buraco negro, o corte no tempo. Robi respirou fundo e agarrou-me por trás, grudando-se ao longo do meu corpo. Eu disse calma e ele me jogou no colchão como uma bola de pingue-pongue. Oscilei umas duas vezes, o colchão gemeu dolorosamente. Deitou sobre mim, tentando desabotoar-me. Está perdendo tempo, eu disse levantando e me despindo. Cabeça pousada nas mãos, Robi sorria, preparando-se para assistir. Muito esperto. Despi-me rapidamente e fiquei olhando bem na cara dele.
Pronto, eu
disse, agora você. Desviou o rosto. Com a mão esquerda foi tirando o blusão, a direita apagou
a luz do teto, permanecendo apenas o foco avermelhado do abajur. Estava
deitada, fumando, quando sua massa
rija desabou sobre mim. Procurei seus lábios mas ele disse não, estou resfriado. Então esperei. Você gosta
assim? perguntou, ajeitando-me de bruços.
Abraçava-me com palmas e dedos gelados, comprimindo minhas costelas, machucando-as, em vez de acariciá-las. A coisa funciona só da cintura para baixo, como um vibrador elétrico, mas é bom, pensei, deixando-me penetrar rijamente pelas costas, usando, por assim dizer, só uma parte do meu corpo, como se o resto estivesse paralisado, ou morto, como se ninguém suportasse um dramático relacionamento frontal, com beijos, orifícios, acidentes e cicatrizes, com um rosto, um nome, uma biografia. O prazer é bom, pensei, costuma ser forte, mesmo assim... Espiei Robi e seu desempenho: cabelos grudados na testa molhada, uma das sobrancelhas arqueadas de perversidade, lábios entreabertos para respirar, braços esticados, mantendo-me firmemente afastada de seu corpo para ver melhor. O que me chateia é esse distanciamento crítico, parece estar consertando a moto - essa máquina de prazer - está olhando a coisa funcionar, como seu próprio coração a bater fora do corpo, as engrenagens da máquina molhadas de suor e gosma orgânica, mais lento, mais acelerado, mais lento, agora rápido, acelere, mais rápido, mais rápido. Pronto. Terminou. Ouvi Robi ofegar. Continuei de costas. Estendi o braço e peguei um cigarro. A respiração agora era regular, pausada. Virei-me para olhá-lo: havia algo de comovedor - sempre há algo de comovedor - num jovem adormecido. Ficam tão desamparados. Braços estirados de sonâmbulos (os mesmos que me empurravam, potentes, há quinze minutos), mãos como dois pássaros gêmeos aninhados, desvalidos, o sexo recolhido no meio das pernas, envolto em espumas de marés mortas, os músculos faciais desabados, descompostos, oferecendo-se e negando-se ao mesmo tempo, supremamente, a qualquer contato humano, fosse um soco ou um beijo, esse rosto inumano das crianças e dos deuses, destruidor florido por sobre quem paira agora uma atmosfera verde de piscina lunar salgada, esse vapor ardente e mortal, bafo primordial de mundos e canteiros de estrelas, de sentimentos em estado gasoso, sóis e planetas.
Bem, pensei, é tarde. Vesti-me rapidamente, em silêncio. Fechei a porta sem ruído. Desci. O saguão deserto. Ao entrar no automóvel, vi o pacote no banco de trás. Essa agora, pensei. Carreguei essa boneca tempo demais, as minhas últimas forças, consegui tirá-la do carro e levá-la até à portaria do hotel. Um em pregado sonolento atendeu-me:
- É para o rapaz
do 35. Acorde-o às seis e quarenta e entregue o presente. Com votos de Feliz
Natal, pensei. Virei as costas e
saí. Guiando de volta para casa, eu me intrigava porque havia mandado o sujeito acordá-lo às seis e quarenta, por que especificamente seis e quarenta? Anoto mentalmente: perguntar ao analista.
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