quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Sexta na Usina: Poetas da Rede: Miguel Angelo Teixeira:


 

MAIS UMA LINHA EM BRANCO

Mais uma linha em branco,

Mais um risco na parede

de uma qualquer viela suja e fria,

mais um dia que nasce, apartado

da vontade de acordar ou de viver.

Rasga-se o corpo perdido, impuro,

ao silêncio engasgado na vergonha da fome,

no orgulho ferido vendido ao desbarato,

na vida cuspida pelas veias de quem já foi gente,

de quem…  já não sente mais.

Mais uma linha em branco que se esgota

na espera da bênção, na prece muda da morte,

da despedida dos que matei em vida,

dos que de mim se esqueceram

no pranto já seco de tantas lágrimas gastas.

Desculpem pais pelos sonhos desfeitos,

nos tentáculos penetrantes do vício,

às mulheres cuja inocência violei e maltratei,

ao filho que não soube amar, abandonado,

cego que estava possuído por falsos deuses e heroínas

que conduziram esta carcaça em braços

ao profundo abismo do meu ser mais insane e indecente

sombra errante sem futuro, saco já vazio de quereres

ao sabor  de um vento agreste perdido de sentido.

Despeço-me do passado embriagado de devaneios,

dos dias consumidos em lamúrias fúteis

em delírios consentidos e inconsequentes,

dilacerando a alma exangue quase fria, quase morta.

Adeus às drogas que um dia soaram quentes

e doces como amantes em pleno cío,

às desculpas, todos os dias inventadas

para a vítima que nunca fui,

para o homem que quis ser,

esquecido do que um dia foi esperança,

hoje ténue e amarga lembrança.

autor: Miguel Angelo Teixeira

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